Naquele que é considerado um dos maiores festivais do mundo e por onde só nos primeiros dois dias passaram mais de 140 mil pessoas (o festival termina no domingo), no Parque da Bela Vista há um espaço pequeno e discreto, Talk Box-Tools to Talk, onde tudo começa e de onde partem sobretudo bons conselhos.
A iniciativa é da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), através da sua Divisão de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (DICAD), e visa sobretudo minimizar e alertar para comportamentos de risco, sejam ligados a bebidas alcoólicas seja a tabaco, a drogas ou sexo sem proteção (falam desse risco quando distribuem os preservativos).
Joaquim Fonseca, coordenador do DICAD, explica à Lusa que a ação que desenvolvem no Rock in Rio é pioneira e que nunca a estrutura esteve no festival com tanta “força”, um posto fixo e 57 pessoas espalhadas pelo recinto, jovens falando, dando conselhos e, este ano também pela primeira vez, distribuindo pulseiras que ”dão acesso” ao consumo de álcool.
Os voluntários identificam jovens que tenham uma “idade dúbia” e mediante a apresentação de comprovativo colocam-lhes uma pulseira inviolável. É uma forma visível de dizerem que têm 18 anos e que a podem mostrar nos bares quando compram bebidas, sem terem de se identificar todas as vezes, uma vez que a ação é coordenada com os bares.
“Vimos nisto uma boa oportunidade para gerar relação, que é o que nos interessa aqui, estar com as pessoas, conversar, eventualmente redireciona-las para o nosso espaço”, conta Joaquim Fonseca, acrescentando: do ponto de vista prático a ideia é facilitar a vida às pessoas que estão nos bares, que na dúvida terão de pedir a identificação da pessoa e isso torna-se pouco prático na relação e estabelece até alguma tensão, que não é o que se pretende.
A aproximação e a conversa, feita por técnicos jovens estudantes e que por isso estabelecem uma “relação de pares”, leva ao aconselhamento sobre drogas, à sugestão de passarem no espaço da ARSLVT, leva à oferta de preservativos ou até de chupa-chupas, uma forma de repor níveis de glicémia, já que muitas vezes os jovens optam por não comer e consomem excesso de bebidas alcoólicas, justifica Joaquim Fonseca.
O modelo das pulseiras é relativamente novo em Portugal, mas já é habitual noutros países e conta o responsável que muitos estrangeiros no Rock in Rio procuram de imediato o local para pedirem uma pulseira.
“Temos como objetivo também institucional o de criar progressivamente uma cultura em que isto se inscreva na matriz de relação das pessoas com estes festivais, sabem que vêm e que tem de ter a pulseira, até para lhes facilitar a vida, para não estar sempre a mostrar o cartão. Em alguns países já é comum as pessoas terem esta cultura instituída e para eles é óbvio que têm de ter uma pulseira para poderem consumir álcool, estamos a tentar começar agora aqui no Rock in Rio”, diz.
E tudo, frisa, começa com uma conversa. Depois, mais de 300 pessoas em cada noite fazem testes, na hora de saída, principalmente de alcoolemia. E alguns, conta o responsável, já não vão conduzir.
Sara Pinho era uma delas na última noite. Foi abordada “por uma senhora” e com uma amiga foram fazer o teste do monóxido de carbono nos pulmões. Não conhecia “mas foi bom”, fuma pouco e estava “dentro dos limites de fumadora passiva”. Saiu mais tranquila.
“Não temos a expetativa aqui de motivar pessoas para um programa de cessação tabágica, mas se acontecer tanto melhor. Tudo aqui é um ponto de partida para uma conversa, para redirecionar, para ficar com um mail”, diz Joaquim Fonseca.
E não se cansa de frisar a importância do diálogo com os jovens, do trabalho das equipas que passa sobretudo por conversar. Porque como diz o provérbio “a falar é que a gente se entende”.
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