
"Adolescência", a minissérie de sucesso da Netflix sobre um miúdo britânico de 13 anos preso sob suspeita de um crime horrível, intensificou a ansiedade de pais preocupados com influências tóxicas e misóginas às quais os jovens são expostos 'online'.
Nas salas de estar de todo o país ou a beber uma xícara de chá ou café no escritório, o drama policial — no qual a estrela de Hollywood Brad Pitt trabalhou como produtor executivo — tem provocado o debate.
No parlamento, o primeiro-ministro Keir Starmer disse que estava a ver em casa com os filhos.
"Adolescência" conta a história de como a realidade de uma família é virada do avesso quando Jamie Miller (Owen Cooper), de 13 anos, é detido pela polícia numa operação ao amanhecer na casa suburbana pelo homicídio de uma adolescente que frequenta a mesma escola que ele.
A minissérie de quatro episódios lançada a 13 de março teve 24,3 milhões de visualizações nos primeiros quatro dias, tornando-se o programa mais assistido da Netflix na semana de 10 a 16 de março, segundo dados oficiais da plataforma.
Cada episódio foi filmado num único e ininterrupto plano-sequência.
"A intensa história desenrola-se em tempo real, à medida que as personagens principais — desde a família envolvida até aos detetives que investigam o crime — procuram respostas na sequência de uma tragédia chocante. Quem é realmente responsável? Porque aconteceu? Poderia ter sido evitado?", resume a Netflix.
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Uma pergunta paira sobre toda a série: este jovem de aparência angelical poderia realmente cometer um crime tão brutal?
A série está a ter ressonância junto de um público cada vez mais perturbado por uma vaga de crimes chocantes com facas cometidos por jovens e pela retórica misógina de influenciadores como Andrew Tate.
O drama destaca a cultura "incel" (celibato involuntário) de homens que se sentem pouco atraentes para o sexo oposto e nutrem ódio por mulheres e como isso é discutido nas redes sociais.
Isabelle, mãe de duas filhas de 16 e 18 anos, disse que ficou "chocada" com a série e estava dolorosamente ciente de que a história "poderia ser verdade".
"Não temos nenhuma perceção da cultura jovem, do Instagram, todas essas coisas das quais não se tem perceção. E os adultos são basicamente excluídos... e isso é realmente assustador", disse a mulher de 49 anos de Glasgow, na Escócia.
"Se a sua criança é sugada para dentro disso, o que se faz, ou como é que a tira disso?", acrescentou.
A imprensa britânica, que aclamou "Adolescência" como forte e oportuna, tem feito a mesma pergunta.
Uma bomba-relógio

"O seu filho é uma bomba-relógio adolescente?", perguntou o tabloide Daily Mail, aconselhando os pais a ficarem atentos aos sinais, como o dos miúdos a passar mais tempo sozinhos nos seus quartos ou ficarem obcecados com o número de seguidores que têm nas redes sociais.
Os argumentistas e atores da produção disseram em entrevistas que ficaram surpreendidos com o seu sucesso.
"Nunca pensámos nem por um segundo que teria tanto impacto", disse o ator e criador Stephen Graham, que também interpreta o pai de Jamie, à BBC.
Ele teve a ideia para a história depois de ouvir no noticiário sobre duas adolescentes que foram assassinadas por homens jovens no espaço de poucas semanas.
"Realmente afetou-me, e fiquei um pouco frio e pensei, em que tipo de sociedade estamos hoje a viver em que esta coisa está a tornar-se um acontecimento regular", disse.

O co-argumentista Jack Thorne disse que a sua pesquisa lhes exigiu que fossem "aos buracos mais escuros da internet".
"Não é preciso muito para ter acesso e estes miúdos estão a ser poluídos por estas coisas, e precisamos parar essa poluição", disse, pedindo a ação do governo.
Michael Conroy, fundador do Men at Work, que ajuda professores e assistentes sociais a envolverem-se com jovens e a combater o sexismo, disse que estava "muito, muito feliz" que a minissérie se tenha se tornado um tema tão comentado.
"O drama é brilhante e será muito usado por professores e pais. Criará debates essenciais."
Mas alertou que se estes debates forem entendidos como críticas, não levariam a "diálogos construtivos e não acho que muitos miúdos ou jovens se envolverão. Sentir-se-ão atacados".
Conroy apela aos adultos para que se interessem pela "manosfera", discursos de masculinidade e a linguagem que os acompanha: "O que estão a dizer? Quais são os códigos?"

"É a série certa a chegar na altura certa", disse Andy Burrows, diretor da Molly Rose Foundation, criada após a morte de Molly Russell, de 14 anos, em 2017, depois que ver conteúdo prejudicial 'online'.
O inquérito sobre a sua morte ouviu que das 16.300 mensagens que Molly guardou, partilhou ou gostou no Instagram no período de seis meses antes da sua morte, 2.100 estavam relacionadas com depressão, automutilação ou suicídio.
"A minissérie fez um serviço incrível ao facilitar o debate nacional sobre o impacto da misoginia extrema e as formas pelas quais o conteúdo 'online' e os influenciadores 'online' são capazes de distorcer as opiniões de adolescentes e miúdos", disse Andy Burrows.
Há vários anos que a fundação vem pedindo uma legislação e regulamentação mais forte dos algoritmos.
"Isso pode ser um chamada de atenção realmente forte para a necessidade de garantir que os jovens não sejam bombardeados algoritmicamente com conteúdo", disse.
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