
Stephen Colbert enviou uma mensagem inflexível ao presidente dos EUA, Donald Trump, durante a sua primeira transmissão desde que o programa "Late Show" foi cancelado em plena tempestade política: "estão abertas as hostilidades" ["the gloves are off"].
Colbert, que abordou o cancelamento do seu programa por um canal amplamente acusado de tentar obter favores de Trump por motivos comerciais, foi direto ao ponto, dizendo a Trump, que festejou o seu cancelamento na sexta-feira, para "ir f****-se".
"The Late Show", um programa da TV norte-americana que remonta a 1993, quando era apresentado por David Letterman, vai terminar em maio de 2026, após um anúncio surpresa do canal CBS na semana passada.
O canal faz parte da Paramount, que está num processo de aquisição de oito mil milhões de dólares que requer a aprovação da Comissão Federal de Comunicações (FCC), controlada por Trump. O canal cancelou o programa três dias depois de Colbert criticar a CBS por ter fechado um acordo judicial com Trump.
Ele acusou a empresa de pagar o que chamou de "um grande suborno" de 16 milhões de dólares ao presidente pelo que chamou de montagem "enganadora" de uma entrevista com a sua oponente nas eleições de 2024, a ex-vice-presidente Kamala Harris.

Trump comemorou a demissão de um dos seus detratores mais prolíficos, partilhando na sua plataforma Truth Social: "Adorei que o Colbert tenha sido despedido. O talento dele era ainda menor que a audiência".
Na segunda-feira, Colbert brincou que sempre foi o seu sonho, desde que começou como comediante de improviso em Chicago na década de 1980, ter um presidente em exercício a comemorar o fim da sua carreira.
Também contestou a lógica da CBS, que insistiu que o cancelamento foi "puramente uma decisão financeira".
Ele disse que, através de fontes anónimas no fim de semana, a CBS pareceu sugerir que o seu programa perdeu 40 milhões de dólares no ano passado.
Colbert brincou que poderia contabilizar perdas de 24 milhões anuais — mas não era o culpado pelos outros 16 milhões, numa referência ao acordo da CBS News com Trump.
VEJA O MONÓLOGO DE STEPHEN COLBERT.
Na segunda-feira, o segmento conhecido por "Cold open" [Abertura fria], exibido antes do genérico do "The Late Show", foi uma crítica implacável à exigência de Trump de que a equipa dos Washington Commanders regressasse ao nome anterior, amplamente considerado uma ofensa aos nativos americanos.
O segmento sugeriu que Trump tentou rebatizar a equipa para "Washington Epsteins", em referência ao empresário pedófilo Jeffrey Epstein, que, segundo relatos, era próximo de Trump.
No seu monólogo, Colbert voltou a este tópico após abordar o cancelamento do seu programa, alegando que tinham cancelado o programa dele, mas não ele próprio, e analisando profundamente as reportagens sobre a proximidade entre Trump e Epstein.
Foi uma fórmula familiar para os fãs do programa: a seriedade mortal temperada com humor e sagacidade.
Noutro momento, Lin-Manuel Miranda e Weird Al Yankovic apareceram para animar o público no estúdio, interpretando " "Viva La Vida", dos Coldplay, numa referência ao escândalo Astronomer, que levou à demissão do presidente executivo após ser apanhado em flagrante com a chefe de Recursos humanos numa "câmara de beijo" durante um concerto recente.
Vários amigos do apresentador foram focados pelas câmaras sentados na sala, como Anderson Cooper, Andy Cohen, Seth Meyers, Jimmy Fallon, Jon Stewart, John Oliver, Adam Sandler, Christopher McDonald e até a personagem Triumph the Insult Comic Dog, do comediante Robert Smigel. Até que Colbert teve que interromper ao receber uma carta oficial a cancelar a canção, "uma decisão puramente financeira".

Do lado de fora da gravação do programa, na sala Ed Sullivan, na baixa de Manhattan (Nova Iorque), manifestantes seguravam cartazes com os dizeres "Colbert fica! Trump tem que sair!".
A espectadora Elizabeth Kott, uma professora de liceu de 48 anos, chamou a demissão de Colbert de "terrível".
"É realmente horrível que tenhamos chegado a este ponto neste país, onde as empresas sentem a necessidade de obedecer antecipadamente. É realmente horrível", disse à agência France Presse (AFP).
"Uma praga na CBS"

A convidada principal de Colbert na segunda-feira, a aclamada atriz Sandra Oh, não se conteve, proclamando uma "praga na CBS e na Paramount" — o canal onde o programa é transmitido e a sua proprietária, a gigante dos media.
Os lábios de Colbert tremeram enquanto Oh prestava homenagem ao seu trabalho de falar a verdade aos poderosos, sem perder o humor.
O seu outro convidado, o ator Dave Franco, disse que adorou o trabalho de Colbert em tudo, do "The Daily Show" ao "The Colbert Report" e, finalmente, ao "The Late Show".
VEJA O SEGMENTO DE DAVE FRANCO.
Foi no "The Daily Show", sob a supervisão do "anfitrião" cómico Jon Stewart, que Colbert aperfeiçoou o seu alter ego — um jornalista conservador fanfarrão cuja ignorância estudada parodiava apresentadores de direita noite após noite.
Ele foi promovido para um programa próprio no mesmo canal, o Comedy Central, que na época fazia parte da Viacom e hoje faz parte da Paramount.
Em 2015, transitou para uma das cadeiras mais cobiçadas da televisão americana — o de apresentador do "late night" da CBS, como o sucessor de Letterman.
Colbert abandonou a sua "persona" conservadora arrogante e cultivou a reputação de uma das figuras mais fiáveis e engraçadas da televisão americana.
Durante a pandemia de COVID-19, tornou-se uma presença reconfortante para milhões de pessoas, transmitindo de uma arrecadação na sua casa e narrando os desafios que enfrentou ao lado da sua esposa, Evelyn.
Também tornou-se um crítico ferrenho de Trump, criticando o presidente por tudo, desde as suas políticas até à sua admiração pelo fictício vilão Hannibal Lecter (celebrizado no cinema por Anthony Hopkins).
Optando por não fazer a habitual sessão de perguntas e respostas após a gravação do programa de segunda-feira, Colbert disse ao público do estúdio que "estava nervoso por vir aqui".
"irei sentir a vossa falta".
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