Se os tempos ainda são de crise, não há nada que uma boa gargalhada não cure. E como o boletim previa risos em alta para o The Famous Fest, lá fomos nós fazer uma paragem neste festival onde se espera o inesperado. E confirmámos as previsões...

O dia 25 de setembro foi o primeiro de dois dias de festival na LX Factory, em Lisboa, com a participação de diversas celebridades dos ramos da comédia e da música. Contudo, para a estreia, nada melhor do que juntar Ricardo Araújo Pereira e António Tabet, da Porta dos Fundos, em algo intitulado de "Isto não é um duelo nem um dueto", que nos serviu como atração principal do dia.

O atraso foi evidente, embora não para todos, não fosse o patrocínio da marca de bebida whisky The Famous Grouse e as senhas gratuitas dadas à entrada, que levavam o público ao balcão do bar para obter a sua bebida grátis enquanto esperavam. Mas temos de admitir que a espera valeu a pena.

Com mais de meia hora de atraso, e após uma curta apresentação de Salvador e João Manzarra, que roubaram os primeiros risos da noite, eis que Ricardo Araújo e António Tabet surgiram em palco, sendo o primeiro levado pela mão do segundo como uma verdadeira princesa, tendo sido recebidos com fortes aplausos que diplomaticamente cediam um ao outro.

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A conversa foi longa, os temas foram os mais diversos, e tudo começou com um desabafo do comediante brasileiro: "Quando me fizeram o convite, nem pensei duas vezes (sobre quem partilhar o palco)! Disse logo que queria o Cristiano Ronaldo, mas 'Oh, não dá...'", lançava para a sua primeira gargalhada do público. A simpatia entre os dois convidados não poderia ser melhor nesta conversa amigável de assuntos tão variados.

Depois a criminalidade foi abordada, não faltando piadas quanto ao panorama brasileiro com conversas sobre as altas vedações, carros blindados e os arrastões nas praias.

E se houve algo constante, esse lugar pertence ao tópico da língua portuguesa. "Quando estou no Brasil parece que tive uma trombose (...) Falar português parece algo estrangeiro! Eu digo muito devagarinho que quero um café expresso, e o empregado olha para mim com um ar muito entusiasta e diz-me 'Yes'", gozava o comediante português perante a dificuldade de compreensão entre um português e um brasileiro, embora ambos falem a mesma língua.

Fama, família e política foram outros dos temas abordados nesta pequena conversa informal, sendo que este último tópico teve pano para mangas. Desde uma explicação bastante consistente entre direita e esquerda protagonizada por Ricardo Araújo Pereira, que deu origem a uma merecida vénia, aos pequenos incidentes de António Tabet com divergências políticas: "A rapariga veio ter comigo e disse 'Posso fazer uma coisa?', e eu que pensava ser uma selfie disse que sim. Não é que ela se vira e 'peida em mim' dizendo 'Isso é para o Gregório'?! Aquilo não só foi um peido feio, como foi um peido político! Mas eu vou entregar, com juros!", declarava escandalizado, levando a mais uma gargalhadas do público.

É também certo dizer que existem sempre grandes debates sobre racismo e religião e neste momento português e carioca, não podiam faltar. Desde relatos de jogadores de futebol negros que eram obrigados a usar pó de arroz para agradar à instituição, negros que profanam outros negros com a desculpa de por serem da mesma cor já não é ofensivo, até chegar ao patamar da religião em que o Brasil nos ganha em fanatismo católico por ver Jesus em todo o lado: "Acham que o senhor vinha lá da outra galáxia para tocar numa vaca?!", gozava António Tabet devido aos extremismos religiosos divulgados nas redes sociais com supostas marcas de Jesus em vacas ou mesmo numa torrada.

Já mais para o fim ficou o tema do futebol, com Cristiano Ronaldo a ser a musa inspiradora de Ricardo Araújo Pereira: "Dizem que ele não é modesto? Ele veio com doze anos para Portugal!", começava sendo interrompido pelas gargalhadas à sua gaffe. "Perdão, para Lisboa. E ainda por cima para o Sporting! O homem subiu na carreira sozinho até ser o melhor do Mundo! Eu no lugar dele andava com uma placa néon a piscar! Andou lá com a russa por não sei quanto tempo? Eu tinha varrido o continente asiático inteiro!", concluía com a plateia desfeita em risos.

Para terminar este mixórdia de temáticas com uma questão do público, onde António Tabet só entende o 'de', deixando a mixórdia e as temáticas de lado, foi a vez de Ricardo Araújo Pereira fazer valer a sua profissão ao declarar ser algo de muito nobre e valioso: "Por isso quando me dizem 'Comediante? Só?', eu digo car****", rematava dando por terminada a sessão com um estrondoso aplauso da assistência.

Ainda assim, a noite estava longe de terminar, existindo ainda espaço para o espetáculo de Fernando Alvim, "Who's Next?". Infelizmente, o espaço era bastante mais pequeno e sem o mínimo cuidado, onde a porta rangia até doer os ouvidos e a música do bar exterior era mais intensa do que a voz dos locutores da noite. Um espetáculo atípico, como o próprio afirmava, tendo-se destacado pela rotatividade de convidados em palco, com Alvim como host da noite. Desde música, teatro e comédia, a escolha era grande, mas não era grande coisa.

Contudo, depois de uma pequena desilusão, ainda fomos a tempo de nos recompor com os "Contadores de Histórias" da noite, numa sessão entre música e conversa com Pedro Tatanka, Luisa Sobral e Miguel Araújo.

As faixas foram várias, entre o conhecido "João" de Luísa Sobral e muitas outras colaborações deste trio que fizeram as delicias do público. Contudo, as histórias faziam parte do programa e Pedro Tatanka deixou isso bem claro ao levar a taça de segundo lugar para melhor comediante da noite. Desde a sua infância rebelde com o amigo Jorge "sem pil*" com quem lutava todos os dias, ao seu despedimento de uma escola após o projeto "Os miúdos traquinas".

E para finalizar em grande, houve até direito a um brinde com a marca patrocinadora, onde um problema técnico deu lugar a mais um momento cómico: "O que é que se passa ai? Mas você trabalha para a The Famous Grouse e não sabe abrir essa porra?", voltava Tatanka a dar nas vistas com o seu lado cómico e a sua perícia ao conseguir abrir, sem esforço, a devida garrafa.

Quanto a nós, dissemos um "até já" para o segundo dia do festival, brindando ao talento que nos faz rir e sentir. E se alguém discordar... passemos apenas a citar o senhor Ricardo Araújo Pereira.

Fotografia: Ana Castro e Carina Sousa