Estudante de Pintura na Faculdade de Belas Artes de Lisboa, Joana Simão foi a vencedora do Concurso Nacional de BD na categoria 17-30. Em entrevista ao Sapinho, conta que já é habitual confundirem o seu nome com Joana Simões e que isso lhe deu um dissabor no Amadora BD, entretanto já resolvido.
- Qual é o balanço do teu percurso até agora?
Acho bastante positivo até. Já tive alguns trabalhos pagos aqui e ali, desde layouts gráficos a pequenas ilustrações, que me servem como bom ponto de começo para uma carreira profissional virada para esta área da ilustração.
- Há oportunidades em Portugal para quem quer fazer disto carreira?
Eu gosto de acreditar que sim. Antes de mais, sou uma rapariga muito patriota; adoro o meu país e adoro Lisboa. Mas isso não me impede de ter curiosidade e de querer ir ver o que há lá fora (isso também está nos meus planos), mas sei que quero fazer carreira aqui.
Acho que a banda desenhada em Portugal é uma coisa que só nestes últimos anos é que está a ganhar voz. A BD portuguesa sempre existiu, mas nunca teve a influência ou dimensão que tem noutros países, portanto era uma espécie de ciclo fechado aos interessados e aficcionados. Mas acho que agora isso está a mudar; há aí muita malta nova a desenhar muito bem, muitos autores novos e muita gente cheia de vontade de expansão para fora, sem perder nem esquecer as suas origens portuguesas. Temos muitos portugueses neste momento a trabalhar para a Marvel e DC, nos estúdios da Disney e Dreamworks. Um dos meus videojogos preferidos, Alice de McGee, é baseado em concept art de um português! Portanto, se lá fora dão valor aos portugueses, porque é que cá não dão? Isso não sei, mas é um grande desperdício.
- Dizes (http://joanamosi.deviantart.com/) que já desenhas desde criança. Como foste evoluindo?
Sim, eu desde pequenina que gosto de desenhar, e desde o início que passei por várias fases/gostos. Só comecei a prestar atenção e a gostar de BD quando cheguei ao 4º ano, portanto, devia ter uns 9 anos, quando comecei a ler Astérix. Pouco tempo depois, aconteceu o fenómeno W.I.T.C.H. do qual eu também fui vítima, e foi aí que comecei a considerar um dia fazer BD profissionalmente. Até aí, a minha ideia era trabalhar em animação ou algo do género, por causa da minha paixão por desenhos animados e afins.
Depois tive uma fase terrível em que consumi muita manga e vi muito anime, mas se isso não tivesse acontecido não teria tido oportunidade de expor o meu trabalho em eventos do género e ter divulgado o meu nome.
Eventualmente, fartei-me dos mangas, e desde então até agora que ando à deriva, a pescar um pouco de cada coisa que leio/vejo e a tentar perceber o que é que quero fazer. A faculdade e o curso que escolhi influenciaram muito o meu desenho e aquilo que faço.
- Quais foram as alterações no teu trabalho a partir do momento que começaste a pintar?
Eu nunca tinha pintado até ter ido para a faculdade, o que parece estúpido ou absurdo visto que o nome do curso é ‘Pintura’. A verdade é que pintar nunca me cativou nem me interessou muito, sempre me foquei no desenho, mas decidi ir para Pintura porque me parecia ser o curso mais amplo e completo da FBAUL, e também porque achei que devia esticar os meus horizontes e experimentar coisas novas. Pintura foi uma dessas coisas, acabei por gostar imenso de pintar e, apesar de ter corrido um bocado mal no início, acabei por apanhar mais ou menos o jeito e até fiz alguns trabalhos que gostei. Graças à pintura consegui ter um melhor entendimento da cor e da aplicação da mesma; senti mais vontade em experimentar materiais novos, para além do básico tinta sobre papel, e abriu-me os olhos para novas misturas de materiais e técnicas. Foi muito enriquecedor nesse aspecto.
-"I love comics, illustration, street art and wheatpaste, wraps and cherry tomatoes, soundtracks, dancing, theme parks and restaurants, 50's and retro fashion, putting food in Tupperware boxes and sloths." - Gostas daquele deste tempo que vivemos em que estamos permanentemente a recordar a arte, naquele espécie de vintage contemporâneo?
Gosto até certo ponto… acho que quando é exagerado torna-se irritante.
Gosto muito dos anos 50/60, especialmente por causa da música, e por isso acho piada a coisas de estilo retro e vintage, lojas de roupa em segunda mão e desenhar pin ups, mas por outro lado às vezes sinto que já é demasiado e que a época em que vivemos agora não tem nada de próprio e característico; é apenas uma amálgama de bocadinhos de outras épocas, e isso é um bocado pobre...
- Tendo em conta a descrição de cima, como descreves o teu trabalho? Qual é o estilo?
Eu não acredito que tenha um estilo... ainda me sinto um bocado confusa, porque aquilo que desenho depende muito do que estou a sentir na altura, daquilo que ando a ler/ver/ouvir, das experiências que estou a viver/ultrapassar... e portanto há dias em que faço coisas mais cuidadas e tradicionais, e há outros em que simplesmente não me preocupo com nada. Apenas esforço-me para que tudo aquilo que faço seja um pedaço de mim, que seja verdadeiro e que, de certa forma, as pessoas se consigam relacionar/identificar. Por isso, acima de tudo, descrevo o meu trabalho como uma coisa muito pessoal, às vezes emocional, apesar de gostar de misturar sempre um pouco de sentido de humor.
- Já conseguiste expor o teu trabalho. Qual tem sido o feedback?
Sim, umas poucas vezes. Geralmente é muito positivo, o que me deixa muito feliz. Gosto de conseguir comunicar com as pessoas através daquilo que desenho.
- Sei que a Joana Afonso é uma espécie de mentora para ti. Que conhecimentos ela te transmitiu?
A Joana Afonso foi minha professora no 1º ano de faculdade, e apesar de já não me dar aulas, continuei a manter contacto com ela, e acho que nisso tive muita sorte. A Joana esteve sempre lá para falar de qualquer assunto relacionado com a BD e afins, sempre me deu bons conselhos e opiniões acerca do meu trabalho e naquilo em que podia melhorar.
- O que significou teres vencido o Concurso Nacional de BD na categoria 17-30?
Ao início foi uma situação muito surreal, porque eu não estava à espera de ser premiada, quanto mais em 1º lugar. Já tinha participado no concurso 2 vezes e numa delas nem tinha sido classificada... por isso quando me ligaram da Amadora foi uma grande surpresa.
Para mim foi uma grande honra ter ganho este prémio, fiquei muito feliz e é sempre bom sentir que o nosso trabalho é reconhecido.
- Houve também um incidente com a escrita do teu nome. Essa situação ficou depois resolvida? Já tens o cheque?
Sim, é verdade. É uma coisa que acontece desde os primeiros tempos de escola, confundirem o meu apelido Simão com Simões. Mas já está tudo resolvido e o cheque também já foi tratado.
Fotografias de Joana Jesus.
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