Uma seleção de obras da Coleção Maria Eugénia e Francisco Garcia, produzidas num tempo pioneiro para a História da gravura em Portugal, vai estar em exposição a partir de quarta-feira no Museu Nacional de Arte Contemporânea, em Lisboa.

Intitulada "Maria Eugénia e Francisco Garcia - Uma Coleção", a exposição apresenta 27 peças de um conjunto que reúne cerca de 70 "exemplares muito significativos e maioritariamente de autores portugueses", além dos múltiplos de Edgar Pillet, Sonia Delaunay, Vasarely, "que se enquadram em produção seriada com características distintas", descreve o museu num teto sobre a mostra.

Este núcleo expositivo comporta gravuras de autores que só se encontram aqui representados, obras de gravura que complementam outras de pintura dos mesmos autores e obras expressivas das diversas técnicas como a gravura em metal, litografia, xilogravura e serigrafia, adianta o museu.

"As gravuras que integram esta coleção foram produzidas num tempo pioneiro para a história da gravura em Portugal e simultaneamente muito generoso. Tal significa que houve a intenção, em particular com a fundação da Cooperativa Gravura, em 1956, de atingir um mercado mais amplo, novos públicos, e potenciar amplas experiências artísticas explorando a criatividade a partir das variadas técnicas da gravura contemporânea", recorda a entidade.

Maria Eugénia e Xico Garcia - como o colecionador era conhecido entre os amigos - tornam-se ambos sócios da Cooperativa Gravura na década de 1960, e, nessa qualidade, tiveram acesso à compra e sorteio periódico de gravuras aí editadas, que constituem a base alargada da coleção, além de outras adquiridas exteriormente.

Ambos viriam a integrar o Clube Cem Cem (1966), que operava como um grupo informal de amigos, apreciadores e colecionadores onde se sorteavam obras de arte.

Juntos, também viriam a constituir, nas décadas de 1960 e 1970, uma coleção de arte "que manifesta as transformações de gosto artístico de uma burguesia cosmopolita, cada vez mais desligada dos constrangimentos do Estado Novo, embora sofresse as suas permanentes consequências", contextualiza, por seu turno, a hsitoriadora de arte Raquel Henriques da Silva noutro texto sobre a mostra, que ficará patente até 29 de maio de 2022.

"Apesar da guerra colonial, pressentia-se que o regime se esboroava e a cultura estava na primeira linha da contestação. Era raro, na Lisboa de então, que o gosto pela pintura incidisse sobre artistas contemporâneos, trabalhando entre a abstração e a nova figuração, esteticamente atualizados e motivados por um mercado em inédita animação", recorda a professora de História da Arte.

Amigos de quase todos os artistas expostos, Maria Eugénia e Francisco Garcia eram também amigos e admiradores de José-Augusto França, historiador, sociólogo e crítico de arte - falecido este ano, em setembro, aos 98 anos - procuravam os seus conselhos, e, por isso, "quando se começou a pensar expor a coleção, ele escreveu para o catálogo o seu último texto, quando estava à beira de completar 95 anos".

Neste "território de amizades" que a coleção espelha destaca-se o convívio permanente com os artistas Fernando Lemos - com mais obras no conjunto - Fernando Azevedo e Marcelino Vespeira.