![Sérgio Godinho no S. Luiz: Cantar a Liberdade no Teatro](/assets/img/blank.png)
À entrada, na sala principal do Teatro S. Luiz, os longos panos vermelhos recolhidos deixavam sobressair, no fundo preto, a palavra "Liberdade" – em letras garrafais, vermelhas, bem no tom dos cravos, e emoldurada pelos dourados do palco do teatro. Um cenário certamente diferente daquele que Sérgio Godinho havia encontrado há 40 anos, quando, regressado a Portugal, deu um concerto para os amigos, para celebrar a revolução, como contou no decorrer do espectáculo. Mesmo que por ali não estivessem amigos, estava, sim, uma sala cheia, que, durante quase duas horas, acompanhou Godinho nas músicas que todos já conhecemos tão bem.
Foi com “Foi aos 25 dias de Abril” que se iniciou esta celebração - uma abordagem mais simples “porque é necessário manter uma ingenuidade criativa”, explicou. “Acesso Bloqueado” trouxe-nos de volta ao presente, não só por ser um tema de “Mútuo Consentimento”, o último álbum que Sérgio Godinho lançou, mas também por retratar “como este país está”. E “Liberdade”, tema que deu nome ao espetáculo e que seria ouvido mais uma vez no final da noite, revelou uma espera de muito tempo, que torna tudo mais urgente. “Mas, felizmente, o chão que pisamos” – de madeira, que rangia com os passos dos presentes que circulavam – “é livre”, comentou o músico. Juntamente com “Maré Alta”, que trouxe a palco o primeiro dos três convidados da noite, Jorge Benvinda, e “Lisboa que Amanhece”, que relembra a madrugada de 25 de Abril e serviu para recordar, também, Sophia [de Mello Breyner-Andersen] e o poema que esta escreveu sobre a mesma madrugada, arrancaram as primeiras reacções mais entusiastas à plateia.
Ouvimos também “Maçã com Bicho”, “Já joguei ao boxe, já toquei bateria”, “Foi a trabalhar”, “Quadro Quadras Soltas” e “Espalhem a Notícia”, esta última a servir de mote para chamar uma mulher bonita, Gisela João, a terceira convidada da noite, que descalça se sentou num dos bancos para cantar “Etelvina”, “Tem o seu preço” e “Balada da Rita”, esta última com particular insistência da fadista, que, em tom de brincadeira, havia dito que a cantaria à porta do São Luiz, para quem a quisesse ouvir. José Afonso, outro cantautor português que se tornou símbolo desta luta, foi relembrado com “Vampiros” e “Na Rua António Maria”, porque “O Zeca gostava de meter as pessoas a pensar, mas também de fazê-las dançar”.
Mas nem tudo é festa. “Fotos de Fogo” relembrou o lado mais negro da luta pela liberdade, através das páginas de um álbum de um soldado. Um passado mais longínquo, que “volta a ser quem não era”. Outro dos momentos dramáticos chegou com “O Fugitivo”, com uma declamação e interpretação de elevada carga dramática, a cargo da atriz Maria João Luís, a segunda convidada da noite.
Na hora da despedida houve tempo para ouvir “Democracia”, “Que força é essa amigo?”, “O primeiro dia” e “A noite passada”, esta última acompanhada por um público que em pé cantava e batia palmas a Sérgio Godinho e Jorge Benvinda, que se encarregaram de cantar o célebre tema de “Pré-histórias”. “Liberdade” foi a derradeira despedida, com os três convidados em palco e um ambiente de festa, já que “é importante que não deixemos de festejá-la e de lutar por ela”.
Texto e fotografia: Rita Bernardo
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