Depois de duas actuações por cá no ano passado (ambas em Lisboa, no Optimus Alive!09 e no Pavilhão Atlântico), poderia haver quem pensasse que um regresso dos Prodigy poucos meses depois seria prematuro. Mas como o trio britânico não é uma banda qualquer, este regresso conseguiu ser muito concorrido (a organização do festival confirmou ao SAPO Música mais de 20 mil espectadores) e dificilmente defraudou as expectativas da maioria.

Ninguém diria, aliás, que "Invaders Must Die" só foi editado em 2009. As suas canções dominaram cerca de metade do alinhamento e, na maior parte dos casos, em nada perderam na comparação com os clássicos inevitáveis do grupo - "Firestarter", "Voodoo People" ou "Poison". De resto, um dos singles mais recentes, "Omen", é já praticamente um clássico, e só duvidará disso quem não viu a nuvem de poeira com que foi acolhido, num dos primeiros picos de intensidade do concerto.

Como habitual, Maxim e Keith Flint trataram das palavras enquanto o mais discreto Liam Howlett comandou - e muito bem - os ritmos, num palco que contou ainda com um guitarrista e um baterista e transbordou garra e magnetismo.

Embora esta edição do festival tenha tido alguns concertos dignos de nota, foi preciso chegar a este - o último do Palco Paredes de Coura - para testemunhar uma química entre público e banda que tenha funcionado com tanta intensidade durante quase hora e meia (e num anfiteatro natural quase a abarrotar, até porque muitos espectadores desta noite foram de propósito a Paredes de Coura só para ver os Prodigy).

Foi um concerto com mais eficácia do que risco, já que quem viu as últimas actuações do grupo em Portugal não obteve aqui grandes surpresas. E se o trio alia como poucos rock e electrónica, é pena que o alinhamento nunca invista em canções menos óbvias (e há tantas que vale a pena revisitar além dessas). Mas quando há uma transição tão conseguida entre "Omen Reprise" e "Invaders Must Die", um contágio tão evidente como o de "Out of Space" (tema que fechou o concerto) ou uma vibração tão forte como a que se disseminou em "Smack My Bitch Up" (onde, mais uma vez, milhares se baixaram a pedido de Maxim para saltarem poucos segundos depois), percebe-se porque é que a banda continua a apostar nestes temas. E fá-lo com tanto impacto que é difícil não aderir (mesmo quando se dirigiu frequentemente à "portuguese people" do Porto quando estava uns quilómetros acima).

Horas antes, ao final da tarde, os Dandy Warhols arrancaram com bastante menos garra. O quarteto norte-americano surgiu em palco com uma postura algo sonolenta - em especial o vocalista - e alguns espectadores ainda se divertiram a tentar adivinhar que substâncias teriam consumido.
Felizmente, à medida que o concerto prosseguiu o assunto passou a ser outro e a música conquistou cada vez mais adeptos, mesmo que o balanço geral não tenha sido impressionante.
O alinhamento, bem delineado, conseguiu espelhar o ecletismo da banda, percorrendo os seus seis álbuns de originais e indo de momentos poppy ("Get Off" ou "Solid", treauteáveis e deliciosos) a outros mais nebulosos ("Mohammed" ou "Good Morning", arrepiantes), passando pelo rock directo e acelerado (as eficazes "The Legend of the Last of the Outlaw Truckers AKA the Ballad of Sheriff Shorty" ou "All the Money or the Simple Life Honey").
Mas o momento mais esperado por muitos era, claro, "Bohemian Like You", de longe o tema mais popular dos Dandy Warhols (por ter sido utilizado, há quase dez anos, numa campanha publicitária). As reacções foram então bem audíveis e, aí sim, propagaram-se pela maioria do público - embora "We Used to be Friends" ou "Not If You Were The Last Junkie On Earth" também tenham resultado muito bem.
No final, a banda aceitou mesmo improvisar uma mudança no alinhamento e aderir ao pedido de alguns fãs das primeiras filas, que ao longo de todo o concerto levantaram um cartaz com o título de uma das canções mais antigas do grupo, "It's a Fast Driving Rave-Up with The Dandy Warhols Sixteen Minutes". "Esta canção tem 18 anos e já não a tocamos há muito tempo. Mas como pediram, hoje vamos tocá-la para vocês", anunciou a teclista Zia McCabe. E assim, pelo menos para dois ou três espectadores, "Bohemian Like You" não foi a canção mais memorável do concerto dos Dandy Warhols - e basta ouvir os primeiros discos da banda para perceber como essa associação pode ser redutora e injusta.

Nesta última noite do festival actuaram ainda os Mão Morta, em mais um momento bem-sucedido da sua digressão em torno de "Pesadelo em Peluche". A densa "Tiago Capitão" e a mais esgrouviada "Fazer de Morto" abriram um concerto que não contornou temas mais antigos e emblemáticos - "E Se Depois", "Cão da Morte" ou o obrigatório "Budapeste". Adolfo Luxúria Canibal mostrou-se com o à vontade habitual enquanto mestre de cerimónicas - e a sua voz deliberadamente rouca combinou bem com a atmosfera nocturna e as cores de tom escarlate que emanaram do palco. E o público, que o vocalista considerou "impagável", retribuiu com a atenção e entusiasmo merecidos.

Outra banda portuguesa bem acolhida, Os Dias de Raiva apresentaram o seu EP de estreia homónimo (editado pela Optimus Discos e disponível para download gratuito) entre muito mosh quando o Sol ainda ia alto. Carlão (ou Pacman, dos Da Weasel) trocou o hip-hop pelo punk hardcore neste projecto que, pelo que se viu, dá-se bem com os palcos e tem já uma base de fãs generosa.

Já com sonoridades mais descomprometidas e solarengas - embora tenham actuado já a meio da noite - os Specials estrearam-se em Portugal 31 anos depois do seu álbum de estreia. "Pedimos deculpa pelo atraso e por não termos tocado para os vossos pais", gracejou a certa o vocalistaTerry Hallentre as suas canções que, em inícios da década de 80, ajudaram a dar outra visibilidade ao ska.

Pelo quarto e último dia do festival minhoto passaram ainda Barbez no Jazz na Relva, Samuel Úria e Triângulo de Amor Bizarro no Palco Iberosounds e Dum Dum Girls e Os Yeah no After-Hours.

Texto @Gonçalo Sá/ Fotos @Alice Barcellos