![Há pianistas entre os legumes da feira de Espinho](/assets/img/blank.png)
"Não sei até que ponto isto pode ter reflexo nas vendas, mas acho muito interessante a coexistência de dois mundos assim tão diferentes, como a música clássica e as bancas da feira", declara à Lusa Simão Ramos, um dos consumidores que parou as suas compras para ouvir o piano. "Deviam fazer isto mais vezes, que é muito bonito", defende a feirante Maria Beleza.
O principal objetivo da iniciativa não era, no entanto, o apelo ao consumo de bens alimentícios e sim um estímulo à participação no Festival Internacional de Música de Espinho (FIME), que, organizado pela Academia local, promove nessa cidade 13 concertos entre a próxima sexta-feira e o dia 25 de julho.
"A feira de Espinho, com 120 anos, e o festival de música, com 50 anos e 40 edições, são das instituições mais antigas da cidade", realça à Lusa Alexandre Santos, diretor da Academia. "Quisemos marcar a 40.ª edição do FIME juntando o popular ao erudito através de um convite metaforicamente feito à população, para que venha aos concertos do festival", explica. Para aquele responsável, trata-se assim de demonstrar que "não há barreiras ao usufruto da música clássica - um mundo que grande parte da população ainda precisa de descobrir".
António Fonseca é cliente regular da feira de Espinho, mas admite que não tem por hábito assistir a espetáculos em sala, sejam os do FIME ou outros. "Já estamos um bocado velhos para essas andanças, mas acho que ter concertos num ambiente assim ao natural é mais bonito", afirma. "Não estava a contar com isto aqui e foi bestial", garante.
Carregada com sacos de flores e um ‘trolley’ com hortaliças, Maria dos Prazeres Cunha também parou para ouvir o concerto e não poupou elogios aos pianistas. "Bem-hajam os jovens que gostam e podem participar nestas coisas", defendeu. Quanto à possibilidade de assistir a um espetáculo semelhante numa sala convencional, a sua análise é gradual: "Era bom. Era fixe. Mas se não fosse muito caro!".
Numa banca em que se destacam vagens e tomates, Olívia Silva mostra-se sorridente, mas ainda não está totalmente convencida. "Não é mau ter o piano a tocar atrás de mim", confessa. "Mas os fregueses deviam ser mais", observa.
Já Maria Beleza, cuja banca está no outro corredor junto ao piano, não tem hesitações: "Isto só é mau porque estou a vender pouco por causa da música. Toda a gente vai para lá ouvir e ninguém me compra nada". Mas a feirante faz a observação por entre com grandes gargalhadas e, lembrando que vende em Espinho há mais de 20 anos, logo a seguir esclarece: "Nunca cá tive nada assim, a não ser em campanhas eleitorais, que são uma fantasia. Prefiro isto, sem dúvida. É muito bonito e deviam ter um espaço próprio para fazer isto mais vezes".
Francisco Seabra, um dos pianistas que hoje esteve de serviço no mercado semanal, está recetivo à proposta. "A capacidade de concentração aqui é muito mais difícil e nunca vamos ter uma sala completamente calada a ouvir-nos, mas há gente a prestar-nos atenção e isso é sempre bom", afirma.
Mesmo tendo atuado diretamente sob o sol e a um metro de distância dos seus espetadores, o jovem músico assegura: "Eu estava um bocado cético no início, mas gostei bastante e estarei sempre disponível para fazer coisas assim".
@Lusa
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