O Sindicato dos Atores de Cinema e Televisão da América (SAG-AFTRA) e os grandes estúdios de Hollywood chegaram a um acordo preliminar na quarta-feira à tarde (início da madrugada em Portugal), o que vai colocar um ponto final a uma greve que entra para a história como uma das maiores na indústria de Hollywood.
"Numa votação unânime esta tarde [quarta-feira], o Comité de Cinema e Televisão do SAG-AFTRA aprovou um acordo preliminar com a Associação de Produtores de Cinema e Televisão (AMPTP) para colocar fim a 118 dias de greve", informou o sindicato num breve comunicado.
A maior greve de sempre dos atores, ultrapassando a dos 95 dias em 1980, terminará oficialmente à 00h01 de quinta-feira, hora de Los Angeles.
O sindicato informou que apresentará o acordo preliminar para os próximos três anos à sua liderança nacional na sexta-feira para "revisão e consideração", após o que fornecerão mais detalhes.
Desde 14 de julho que SAG-AFTRA e AMPTP estavam divididos em temas como o aumento do salário mínimo em 11% e das contribuições patronais para a segurança social e pensões.
No entanto, os principais obstáculos nas negociações eram as compensações de direitos residuais pelas produções exibidas nas plataformas de streaming e as condições mínimas para a utilização da Inteligência Artificial (IA), incluindo a indemnização dos profissionais e uma cláusula de consentimento.
Numa comunicação aos seus membros na quarta-feira ao fim da tarde, o SAG-AFTRA disse que "num contrato avaliado em mais de mil milhões de dólares, alcançámos um acordo de dimensão extraordinária que inclui aumentos do salário mínimo 'acima do padrão', disposições sem precedentes para autorização e compensação que protegerão os membros da ameaça da IA e, pela primeira vez, estabelece um bónus de participação no streaming. Os nossos tetos limite para Pensões e Saúde foram substancialmente aumentados, o que trará recursos muito necessários aos nossos planos. Além disso, o acordo inclui inúmeras melhorias para diversas categorias, incluindo aumentos de remuneração invulgares para figurantes e disposições contratuais fundamentais que protegem diversas comunidades".
"Chegámos a um contrato que permitirá aos membros do SAG-AFTRA de todas as categorias construir carreiras sustentáveis. Muitos milhares de artistas, agora e no futuro, beneficiarão deste trabalho", acrescentou.
Já a AMPTP destacou em comunicado que "este acordo preliminar representa um novo paradigma. Dá à SAG-AFTRA os maiores ganhos contratuais na história do sindicato, incluindo o maior aumento nos salários mínimos nos últimos 40 anos; novas compensações de direitos residuais para programas de streaming; extensas proteções de consentimento e compensação no uso de Inteligência Artificial; e aumentos contratuais consideráveis em todo o tipo de itens”.
Os atores poderão regressar ao trabalho, promover os seus projetos e fazer campanha durante a temporada de prémios, enquanto decorrer o processo de ratificação junto dos 160 mil artistas da SAG-AFTRA, que junta desde as estrelas aos figurantes, que poderá demorar semanas, mas cuja aprovação é amplamente esperada.
Uma longa luta para mudar uma estrutura salarial muito antiga
Segundo a imprensa especializada, o acordo preliminar está alegadamente "recheado" de aumentos salariais e compensações, incluindo um bónus das receitas de streaming baseado no sucesso das produções, e garantias "completas" de proteção em relação à IA.
Embora as estrelas de elite de Hollywood ganhem milhões, muitos atores menos conhecidos disseram que se tornou quase impossível ter uma vida sustentável, uma vez que as antigas estruturas salariais não conseguiram acompanhar a inflação e as mudanças na indústria.
Além de produções fora dos grandes estúdios abrangidas por acordos de exceção, Hollywood praticamente parou quando a greve dos atores a 14 de julho se juntou à dos argumentistas, que começara a 2 de maio: para lá das filmagens, também foram suspensas a promoção de filmes, as passadeiras vermelhas, estreias e até a cerimónia de entrega dos Emmys, que decorreria em setembro.
Após várias interrupções e muita contra-informação, as negociações intensificaram-se a 24 de outubro e decorreram quase diariamente nas últimas duas semanas, com os presidentes executivos de estúdios como Disney, Netflix, Warner e Universal frequentemente a comparecerem pessoalmente, à medida que aumentava a pressão por um acordo.
Desde sexta-feira (3 de novembro) que o SAG-AFTRA analisava uma proposta dos grandes estúdios que fora descrita como "a última, melhor e final".
No entanto, o sindicato disse na segunda-feira que estava em desacordo em pontos como o que se referia à IA e as negociações foram retomadas.
No interior de Hollywood, o início de novembro era encarado como o limite para ainda conseguir colocar filmes e séries em produção, o que dificilmente aconteceria depois da época festiva do "Thanksgiving" (Ação de Graças) no dia 23 e começar a contagem decrescente para o Natal, ficando os grandes estúdios sem o incentivo e a pressão para chegarem a acordo.
Dada a duração da greve, os estúdios já enfrentam problemas nas suas agendas de estreias para o próximo ano e depois, enquanto muitos atores foram forçados a encontrar um segundo emprego ou a abandonar a indústria.
Sgundo notícia do The Wrap (acesso pago), se as negociações voltassem a falhar, a AMPTP preparava-se para desistir e só regressar à mesa em janeiro.
Uma fonte revelou que os estúdios acreditavam que nenhuma produção poderia arrancar antes de 2024 e a temporada de TV estaria perdida se um acordo não fosse alcançado nos primeiros dias de novembro, tendo como consequência a ausência de filmes de Hollywood nos cinemas até ao verão (o artigo não esclarecia se se tratavam apenas das grandes produções).
Nesta perspetiva mais pessimista, "Deadpool 3", "Missão Impossível 8", a versão em imagem real de "Branca de Neve" e "Elio" não seriam os únicos grandes filmes adiados: para os primeiros meses de 2024 estão agendados "Madame Web", "The Fall Guy", "Dune - Parte II" (que já mudara de data por causa da greve), "IF", "Furiosa" e os novos "Caça-Fantasmas" e "Planeta dos Macacos".
Estima-se que se tenham perdido 45 mil empregos com a greve dos atores combinada com a dos argumentistas, que durou 148 dias e terminou a 27 de setembro.
Kevin Klowden, do Milken Institute, indicou que os prejuízos chegam aos 6,5 mil milhões de dólares (6,12 mil milhões de euros), só na economia do sul da Califórnia, o que incluía de restaurantes a floriculturas e lojas de roupas, já que inúmeras empresas dependem de Hollywood.
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