O ator e compositor Lin-Manuel Miranda é o mercenário Lee Scoresby, personagem memorável da série "Mundos Paralelos", a grande aposta atual da HBO que já estreou no nosso país esta segunda-feira, 4 de novembro. Em Los Angeles, falámos com um fã de Philip Pullman, alguém que se considera um sobrevivente e uma estrela humilde.
Como é que um ator da Broadway, famoso por cantar e dançar, vem parar até aqui?
Apaixonei-me por estes livros do Philip ao mesmo tempo que me apaixonava pela minha mulher. Ambos decidimos começar a ler esta saga mal começámos a namorar! A dada altura ficámos malucos por esta história incrível. Na verdade, lemos os livros do "Mundos Paralelos" bastantes vezes! Parecemos uns loucos por festas, não é? E depois o convite veio na altura em que filmava "O Regresso de Mary Poppins" em Londres e o argumentista e a produtora convidaram-me. Fiquei encantado! Ainda para mais para ser o Han Solo desta história, um tipo que só pensa na sua sobrevivência! Vejo-o como uma mistura do Gary Cooper em "O Comboio Apitou Três Vezes" e o Bugs Bunny.
Que tipo de trabalhos procura nesta altura da sua carreira?
Depois do sucesso do espetáculo "Hamilton" estou numa fase muito privilegiada: posso escolher o que me apetecer!! Já nem tenho de trabalhar apenas para o dinheiro. Por exemplo, no final da temporada 6 de "Os Sopranos" tive um pequeno papel como rapaz do elevador. Esse trabalho foi o que me conseguir fazer pagar a renda durante dois meses. Agora tudo é diferente – aceitei o "Mundos Paralelos" porque era doido pela obra literária e porque percebi que o Jack Thorne, o argumentista, iria conseguir colocar todas as ideias dos livros na série. A HBO percebeu que era preciso tempo para adaptar isto! Para mim, entrar nesta série foi uma aventura, uma possibilidade de ser transportado para um outro mundo. De algum modo, foram umas férias para mim. Mal acabei a temporada 1 disse a um membro da equipa que agora é que tinha de trabalhar – em Nova Iorque tinha de compor canções para três projetos diferentes. "Mundos Paralelos" era a minha chance de ser um "cowboy" num balão de ar quente.
Neste momento é uma das pessoas mais ocupadas de Hollywood. A pergunta que faço é se tem mesmo tempo de saborear todo este sucesso?
Sabe que mais?! Tenho! Até gosto deste processo das entrevistas! O meu segredo é que o sucesso de "Hamilton" aconteceu numa altura em que já tinha percebido quem realmente sou. Enfim, já estava casado, já tinha tido o meu primeiro bebé e tinha as minhas prioridades definidas. Esse era o melhor filtro para enfrentar todo o sucesso que tive. Posso dizer que na altura tive convites que recusei, apesar de perceber que o Lin-Manuel com 25 anos teria aceite...Entendi que tinha de decidir com o meu instinto. Quando o instinto não funciona, recorria à minha mulher.
Vai-me dizer que o seu ego nunca ficou tentado?
Não, pois sempre fui rodeado por aqueles que me acompanharam toda a minha vida. Pessoas que são peritas em por-me no lugar quando começo com as minhas tretas. Bem, mas no pique da loucura do "Hamilton", depois do espetáculo, fui levado para os copos por um realizador muito famoso e oscarizado que queria convencer-me a protagonizar um anúncio de topo para uma marca de automóveis. Pensei: “este é o meu realizador preferido e está a convidar-me para ficar 'cool' a guiar num anúncio de milhões para passar na final do Super Bowl”. Depois, chego a casa e conto à minha mulher, ao que ela me lembra: “Lin, tu não tens carro!! Acho que rias de vergonha desse anúncio”. Como vê, tenho esse tipo de suporte que faz com que fique mesmo humilde.
E acredita que "Mundos Paralelos" tem algum tipo de mensagem social para os dias de hoje?
Quem me dera que em 2019 o "Mundos Paralelos" não fosse relevante. O facto de estarmos a falar sobre controlo institucionalizado para os nossos corpos, bem como de crianças a serem separadas dos seus pais, é um horror se encontramos equivalência no mundo real. E encontramos... O grande conceito de "Mundos Paralelos" é podermos refletir sobre o flagelo de instituições, religiosas ou governamentais, poderem retirar-nos a liberdade pessoal, usando a moralidade como desculpa. Tenho muito orgulho em fazer parte de uma série que foca estes temas.
Nesta série, todos têm um animal como alma gémea. Qual seria o seu na vida real?
Antes respondia o meu cão, o amado Toby, embora agora seria a ratazana das pizzas. "Googlem" "New York City Pizza Rat" e podem ver como uma ratazana consegue carregar uma fatia de pizza para o metro. Trata-se de Nova Iorque, o seu espírito de sobrevivência, numa imagem! Gosto de pensar que sou um pouco assim, algo giro mas sobretudo desajeitado e com perícia para sobreviver a todo o custo.
O Lin é então um sobrevivente?
Gosto de pensar que sou um sobrevivente! A ética de quem quer viver à custa da arte tem de ser esta, ou seja, às vezes temos de nos contentar com uma fatia de pizza. Em resumo, tentar chegar a algo maior do que nós. Uma grande fatia de pizza pode ser mesmo inspirador.
Rui Pedro Tendinha, em Los Angeles
"Mundos Paralelos" chegou à HBO Portugal a 4 de novembro.
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