A realizadora Cristina Ferreira Gomes acompanhou o processo criativo da coreógrafa Vera Mantero, feito de “pesquisa constante e questionamento incessante”, e o resultado é um documentário que terá antestreia na sexta-feira, em Serralves, no Porto.
Filmado ao longo de um ano, entre as cidades do Porto e Lisboa, este projeto acompanhou, de forma íntima, a criação do espetáculo “O susto é um Mundo”, de Vera Mantero, e é também uma viagem pelo percurso artístico de quatro décadas de uma das mais importantes artistas contemporâneas do país.
"Vera Mantero" é o primeiro documentário de três – sobre as coreógrafas Olga Roriz e Clara Andermatt – que Cristina Ferreira Gomes está a criar para a RTP em conjunto com o coreógrafo, investigador de dança e bailarino Luís Antunes, através da produtora Mares do Sul.
“Eu nunca tinha filmado dança e gostei muito. É ‘prazeiroso’ e desafiante, e também um trabalho muito bonito”, comentou Cristina Ferreira Gomes entrevistada pela agência Lusa sobre o documentário dedicado a Mantero, um das figuras mais destacadas da Nova Dança portuguesa.
Vera Mantero “tem um trabalho coreográfico extraordinário, multifacetado, muito denso, de pesquisa constante e questionamento incessante do que ela faz, e do que pretende transmitir ao publico”, descreveu.
O espetáculo “O susto é um Mundo”, estreado no Rivoli, no Porto, e depois apresentado na Culturgest, em Lisboa, em 2021, percorre questões ligadas às contradições da sociedade contemporânea que passam pela ética, o politicamente correto e a educação para a cidadania.
Quanto ao projeto do documentário, surgiu na continuidade do trabalho que Cristina Ferreira Gomes tem vindo a realizar com Luís Antunes, iniciado com uma colaboração para o programa “Portugal que Dança”, numa série de 16 episódios para a RTP2.
“Estivemos mais de um ano a filmar a mais jovem geração de coreógrafos portugueses de dança contemporânea”, indicou, sublinhando que a experiência correu tão bem que resolveram investir em mais projetos sobre esta área artística.
“É uma área criativa que tem muito pouca visibilidade em audiovisual, seja no cinema ou televisão, e, por isso, desafiámos a RTP a continuar”, disse à Lusa, acrescentando que a ideia de criar documentários sobre três coreógrafas consagradas foi bem aceite, para serem transmitidos pela televisão pública.
Cristina Ferreira Gomes precisou que os filmes são independentes entre si: “Cada um dos documentários terá uma abordagem individualizada de acordo com o perfil, personalidade, percurso, e densidade de trabalho” de cada coreógrafa.
Acompanhar de perto a criação do espetáculo “O susto é um Mundo”, de Vera Mantero, ao longo de mais de um ano, com um grupo de bailarinos, foi surpreendente segundo a realizadora: “Foi muito interessante ver de perto esse processo, denso, de grande busca e pesquisa por parte da coreógrafa. Por outro lado, os 'flashbacks' sobre a carreira de Vera Mantero, dão a conhecer as raízes dessa forma de trabalho artístico”.
No acompanhamento do modo de criação, a equipa deparou-se com “a exemplaridade da sua capacidade contínua de discutir ideias e de reagir a conjunturas que definem a realidade contemporânea, para depois as partilhar com artistas, performers, pensadores e públicos, em função das suas motivações e expressões artísticas”.
Vera Mantero estudou dança clássica com Anna Mascolo e fez parte do Ballet Gulbenkian entre 1984 e 1989 e, em 1999, viria a fundar o Rumo do Fumo, estrutura de criação e produção artística.
Em 2002 foi-lhe atribuído o Prémio Almada, do Ministério da Cultura, e, em 2009, o Prémio Gulbenkian Arte pela sua carreira como criadora e intérprete.
Dois anos depois representou Portugal na 2.ª Bienal de São Paulo com "Comer o coração", projeto criado em parceria com o escultor Rui Chafes.
Cristina Ferreira Gomes indicou que o documentário sobre a coreógrafa Olga Roriz deverá estar concluído no início de 2024 e o de Clara Andermatt “ainda é prematuro anunciar" porque a coreógrafa “não conseguiu apoio da Direção-Geral das Artes”.
“É uma situação absolutamente injusta. O financiamento às artes continua a ser um problema gravíssimo no nosso país, em todos os setores, não só na dança, mas também no audiovisual e no cinema, e temos todos de continuar a batalhar em relação a este problema da precariedade e da falta de financiamento adequado para conseguirmos continuar a trabalhar”, lamentou a realizadora.
Questionada sobre financiamento para o projeto dos documentários, disse que a produção teve apoio da Câmara Municipal de Lisboa e que o Programa Garantir Cultura apoiou a criação.
A antestreia do documentário “Vera Mantero” está marcada para sexta-feira, às 22h00, no auditório da Fundação de Serralves, seguida de uma conversa entre a coreógrafa, a realizadora Cristina Ferreira Gomes e o autor Luís Antunes.
O público poderá ver o documentário em estreia na RTP2, no sábado, também pelas 22h00.
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