Fruto de uma coprodução Teatro Nacional São João e Teatro do Bolhão, encenada por Rogério de Carvalho e com dramaturgia e tradução de Alexandra Moreira da Silva, “Lorenzaccio” oferece ao espetador duas tragédias – a pessoal e a da cidade – e várias intrigas.

No que diz respeito à tragédia pessoal, em causa está o protagonista, Lorenzo, depreciativamente chamado “Lorenzaccio”, e já no que se refere à cidade, essa é Florença, cidade italiana que se “transfere” para o Bolhão, no Porto, mas não se apresenta ao espetador de forma física ou visual, uma vez que palco aparece perante a assistência despojado de cenário, praticamente vazio, como que em contradição com a linguagem da peça, clássica e densa.

São expressões como “uma multidão de sombras”, acompanhada pelo olhar da atriz no horizonte, ou “aquela mulher bonita ali ao longe”, sussurrada pelo ator, que têm a tarefa de localizar o público no espaço.

Também os sons, como o da água que – conforme revelou esta tarde Rogério de Carvalho aos jornalistas após um ensaio de imprensa – representa o rio Arno de Florença, têm essa tarefa de contextualização.

“O espaço é abstrato. Pode ser a praça ou o palácio, uma paisagem humana. A presença e a palavra do ator é que determinam o espaço. Dá-se espaço ao imaginário do espetador. Esta é uma peça literária. A escuta do espetador é muito importante”, descreveu Rogério de Carvalho.

Ao lado, o ator protagonista, Cláudio da Silva, e a atriz Sandra Salomé, desvendam que “Lorenzaccio” é “uma reflexão sobre a natureza humana” e integra “ideias muito pertinentes quer para uma leitura pessoal, quer coletiva, face à atualidade”.

De acordo com o programa de sala da peça, “Lorenzaccio” é “sobre uma cidade, um ser coletivo feito de inúmeras vozes, comunidade humana que a corrupção política destrói e divide”.

Já a sinopse desta peça em cinco atos diz que Alfred de Musset conta “a partir de relatos da história de Florença do século XVI o derrube do ducado tirano de Alessandro de Médeci, assassinado pelo primo Lorenzo, depreciativamente chamado ‘Lorenzaccio’ porque frustra os ideais de mudança”.

“Musset ergue tanto um drama pessoal em torno desta figura, assombrada por uma inquietação hamletiana, como uma crítica a uma sociedade em decadência”, lê-se na sinopse que também apresenta “Lorenzaccio” como uma “obra crucial do drama romântico francês, tida como irrepresentável” por ter sido várias vezes alvo de censura moral ou política e devido ao número de personagens e às mudanças bruscas de lugar, aquele lugar em palco que pertence à imaginação do espetador em cumplicidade com o ator.

“Não é à toa que o texto esperou quase 200 anos para ser apresentado. Parece mais um argumento de um filme do que uma peça de teatro, pelo menos no sentido clássico ou quando pensamos na forma como o teatro era entendido quando ele [Alfred de Musset] o escreveu”, referiu esta tarde o diretor do Teatro do Bolhão, Pedro Aparício.

Ideias sociais, a luta pública e política, a tirania, um Lorenzo de sombras e um Lorenzo clarividente, a noção de honestidade, e a solidão de um herói – são vários aspetos de um espetáculo que esteve para estrear a 28 de maio, mas circunstâncias relacionadas com a pandemia da COVID-19 obrigaram a uma reformulação de calendário e de elenco.

“Este foi e é um desafio tremendo até porque o elenco é muito grande. Mas desde a sua fundação que o [Teatro do] Bolhão ambicionava estrear ‘Lorenzaccio’”, contou esta tarde Pedro Aparício, enquanto Alexandra Moreira da Silva, citada no dossier distribuído à imprensa, refere-se a esta estreia nacional como “um marco hercúleo”.

“Lorenzaccio” está em cena até 14 de novembro às quartas e quintas-feiras às 19:00, às sextas-feiras e sábados às 21:00, e aos domingos às 16:00.

Para dia 25 de outubro está agendada uma conversa pós-espetáculo, enquanto a recita do dia 01 de novembro conta com tradução simultânea em Língua Gestual Portuguesa.

O preço dos bilhetes é de 10 euros.