(*) Notícia atualizada à 01h00 com reação de Alec Baldwin, declarações dos procuradores especiais e novas informações do Wall Street Journal.

A justiça norte-americana retirou as acusações de homicídio involuntário contra o ator Alec Baldwin pela morte da diretora de fotografia atingida a tiro em outubro de 2021 na rodagem do filme “Rust” no Estado do Novo México, divulgaram os seus advogados esta quinta-feira e confirmaram os procuradores encarregues do caso.

"Estamos muito satisfeitos com a decisão de arquivar o caso contra Alec Baldwin e encorajar uma investigação adequada sobre os fatos e circunstâncias deste trágico acidente", disseram Luke Nikas e Alex Spiro num comunicado enviado à France-Presse.

Estava marcada uma audiência preliminar para 3 de maio que determinaria se existiam indícios suficientes para avançar para julgamento do ator e da armeira Hannah Gutierrez-Reed, a responsável pelo protocolo de segurança durante a rodagem.

Conhecida no mesmo dia em que as filmagens do filme eram para ter sido retomadas no Estado de Montana (terá sido adiada para esta sexta-feira), a decisão surge após terem sido nomeados dois novos procuradores especiais no final de março para supervisionar as acusações criminais.

Segundo fontes da imprensa norte-americana, Kari Morrissey e Jason Lewis deverão apresentar à justiça nas próximas horas a moção para retirar a acusação "without prejudice", um termo jurídico no sistema americano vindo do latim "salvis iuribus" que permite às autoridades continuar a investigar o que se passou e voltar a apresentar um caso contra o ator no futuro.

Um comunicado na quinta-feira à noite confirmou essa posição: "Nos últimos dias e em preparação para a audiência preliminar de 3 de maio de 2023, novos factos foram revelados que exigem mais investigação e análise forense no caso contra Alexander 'Alec' Rae Baldwin, III. Consequentemente, não podemos prosseguir nos atuais constrangimentos de tempo e com os factos e indícios apresentados pelas forças policiais na sua forma atual. Portanto, vamos retirar a acusação de homicídio involuntário contra o senhor Baldwin para conduzir uma investigação mais aprofundada. Esta decisão não absolve o senhor Baldwin da culpabilidade criminal e acusações podem ser reapresentadas. A nossa investigação de escrutínio permanecerá ativa e em andamento".

Os procuradores especiais acrescentaram que se mantém a acusação contra Gutierrez-Reed, que também se declarou inocente, afirmando que verificou que os cartuchos com os quais tinha carregado o revólver eram cartuchos em branco.

Uma audiência virtual está marcada para esta sexta-feira em Santa Fé.

Baldwin reagiu nas redes sociais com uma fotografia ao lado da sua esposa Hilaria e a mensagem "Devo tudo o que tenho a esta mulher (e a ti, Luke)", o que é uma referência ao seu advogado Luke Nikas.

Segundo avançou uma fonte ao Wall Street Journal, as acusações foram retiradas após novos indícios sugerirem que a arma podia ter disparado mesmo sem puxar o gatilho.

Alec Baldwin sempre afirmou a sua inocência e que lhe garantiram que a arma era inofensiva. Além disso, negou ter puxado o gatilho, uma afirmação questionada por vários especialistas e pelo relatório apresentado pelo FBI. A mesma fonte disse ao jornal que a arma foi alterada antes de chegar ao 'set' para permitir disparar uma bala mesmo sem que o gatilho fosse puxado.

Acusações polémicas, autoridades na defensiva

Mary Carmack-Altwies à direita

A retirada das acusações a Baldwin é o mais recente revés para a Procuradoria do Estado do Novo México, que se viu praticamente na defensiva logo a seguir a Mary Carmack-Altwies, procuradora distrital do condado de Santa Fé, decidir avançar a 30 de janeiro com duas acusações de homicídio involuntário cada contra Gutierrez-Reed e Baldwin relacionadas com o incidente a 21 de outubro de 2021, quando o ator durante um ensaio disparou uma arma que devia contar munição falsa, ou seja, sem pólvora, mas cujo projétil muito real matou a diretora de fotografia Halyna Hutchins, de 42 anos, e feriu o realizador Joel Souza.

A primeira acusação acarretava uma pena até 18 meses de prisão e multa de cinco mil dólares, mas a segunda, com uma circunstância agravante, tinha a pena mais grave: além de ser um crime punível com até 18 meses de prisão e multa até cinco mil dólares, exigia que se fizesse prova que houve mais do que simples negligência envolvida numa morte e estando em causa uma arma de fogo, estava sujeita a uma sentença obrigatória de cinco anos de prisão se fossem considerados culpados.

A segunda acusação foi retirada três semanas depois depois de ter sido contestada pelos advogados do ator por se basear numa lei do Novo México que não estava em vigor na época da tragédia.

A meio de março, o caso perdeu a procuradora especial Andrea Reeb, uma das responsáveis pela apresentação das acusações, após os advogados de Baldwin sustentarem que a constituição do Novo México a impede de ter essa função enquanto for legisladora estadual.

Duas semanas mais tarde, a própria Mary Carmack-Altwies foi forçada a renunciar quando os advogados do ator avançarem com uma ação para a desqualificar por um potencial conflito de interesses, alegando que, enquanto membro da Câmara dos Representantes do Novo México, não podia exercer simultaneamente o poder legislativo e judicial.

Halyna Hutchins no centro, durante a rodagem de "Rust"

O incidente do disparo chocou Hollywood e provocou apelos pela proibição de armas de fogo nos sets de filmagem, além de levar a novas precauções de segurança na indústria cinematográfica.

No entanto, o sindicato profissional dos atores americanos (SAG-AFTRA) emitiu um comunicado contundente onde descreveu a morte de Halyna Hutchins como uma "tragédia" e ainda mais porque podia ter sido evitada depois de ser conhecida a decisão de acusar Baldwin, salientando que era "errada e desinformada" pois o que aconteceu não é “uma falha no dever ou um ato criminoso por parte de qualquer artista”.

“A alegação da procuradoria de que um ator tem o dever de garantir a operação funcional e mecânica de uma arma de fogo num set de produção é errada e desinformada”, escreveu o sindicato.

"O trabalho de um ator não é ser um especialista em armas de fogo. As armas de fogo são fornecidas para o seu uso sob a orientação de vários profissionais especializados diretamente responsáveis ​​pela operação segura e precisa dessa arma de fogo. Além disso, o empregador é sempre responsável por fornecer um ambiente de trabalho seguro em todos os momentos, incluindo a contratação e supervisão do trabalho dos profissionais treinados em armas", acrescentava o comunicado.

A organização recordou que os padrões da indústria para a segurança com armas de fogo e uso de munição vazia estão "claramente definidos" e as "diretrizes não tornam responsabilidade do executor verificar qualquer arma de fogo".

"Os artistas treinam para atuar e não é exigido ou esperado que sejam especialistas em armas ou experientes no seu uso. A indústria atribui essa responsabilidade a profissionais qualificados que supervisionam o seu uso e manuseio em todos os aspetos. Qualquer pessoa que tenha uma arma de fogo no set deve receber treino e orientação sobre o seu manuseio e uso seguro, mas todas as atividades com armas de fogo no set devem estar sob a supervisão e controlo cuidadosos do armeiro profissional e do empregador", notava.