O Presidente da República entregou na quinta-feira o Prémio Camões 2023 ao ensaísta, tradutor e crítico literário João Barrento, que elogiou, considerando-o "um grande criador", com uma obra que "é exemplo de resistência ao indiferentismo desmemoriado".
A cerimónia de entrega do Prémio Camões 2023 a João Barrento teve lugar no claustro do Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa.
No seu discurso, o chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa, elogiou também o galardoado, professor universitário, como "grande pedagogo" e defendeu que merece o Prémio Camões por tudo o que ensinou e escreveu e "pelo exemplo que esse sentido de vida é no presente e para o futuro".
"Por isso, certamente por isso, o Presidente da República Federativa do Brasil [Lula da Silva] subscreveu, entusiasta, a escolha do júri. O Presidente da República Portuguesa a essa escolha aderiu, sentindo que se estava a homenagear um grande criador da nossa literatura, na nossa literatura, na nossa afirmação como Portugal", afirmou.
Segundo o Presidente da República, "a obra de João Barrento é exemplo de resistência ao indiferentismo desmemoriado que denuncia" e nela, desde os primeiros ensaios até agora, "há uma coerência, há uma consistência, há uma densidade, presente em todas as buscas de sentido, do ensaio à poesia, e sempre e também na tradução, que é uma recriação literária".
Marcelo Rebelo de Sousa apontou-lhe como característica "um duplo tom", por um lado "o tom apocalíptico" e por outro "o tom resistente".
"O apocalipse – talvez este termo seja demasiado tremendista – consiste num processo que denúncia, de perda da memória e da densidade cultura, de superficialidade, de imediatismos mediático, de ausência de pensamento crítico, para o qual a própria imprensa muito contribuiria. É, em suma, o lamento profundo de um intelectual pelo desaparecimento dos intelectuais no espaço público", descreveu.
"Simultaneamente, nunca se eximiu João Barrento de tarefas dissidentes, refratárias ao consenso", acrescentou.
O Presidente da República salientou que João Barrento recebeu "quase todos os prémios mais relevantes em Portugal: o Calouste Gulbenkian, o Prémio de Ensaio Jacinto do Prado Coelho, o Prémio D. Dinis, sucessivos prémios de ensaio, crónica e tradução da Associação Portuguesa de Escritores e do PEN Clube".
"Reconhecido pelos seus pares, o público de literatura deve-lhe boa parte do contacto recente em português com autores fundamentais da língua alemã", realçou.
No seu entender, "o facto de ter vencido o Camões é significativo de um entendimento alargado deste prémio, que além de poetas e romancistas também premiou críticos e ensaístas decisivos, como Eduardo Lourenço e António Cândido, valorizando estes géneros enquanto géneros literários, menos visíveis do que outros, mas de extrema importância no longo curso".
"Diria, então, que nem o apocalipse é uma fatalidade nem a resistência é fútil. Se às vezes duvidamos de que a história seja mestra da vida, João Barrento diz-nos que a ausência de história é que não é mestre de nada", comentou Marcelo Rebelo de Sousa.
O Prémio Camões de literatura em língua portuguesa foi instituído por Portugal e pelo Brasil em 1988, com o objetivo de distinguir um autor "cuja obra contribua para a projeção e reconhecimento do património literário e cultural da língua comum", e foi atribuído pela primeira vez em 1989, ao escritor português Miguel Torga.
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