“Mar Negro” é a segunda banda desenhada de Ana Pessoa e Bernardo P. Carvalho, depois de terem feito “Desvio” (2020), e nela apresentam Inês e JP, dois jovens que estão a terminar um trabalho de verão, num café à beira da praia.
A ação de “Mar Negro” começa no mesmo local onde acabou a de “Desvio”, nesse bar de praia, o “Conchas”, embora com personagens e uma abordagem narrativa distintas.
“Porque sou uma nostálgica e quero sempre salvar as minhas histórias e personagens, escolhi como cenário o café de praia. (…) A história foi aparecendo aos poucos, sempre em torno do café, onde a Inês trabalha atrás do balcão e o JP serve às mesas”, escreveu Ana Pessoa na página oficial da Planeta Tangerina.
“Mar Negro” centra-se sobretudo em Inês, uma adolescente em mudança, a caminho da idade adulta, que se confronta consigo própria depois de um acontecimento trágico no mar, quando morre uma rapariga que frequentava o café e que também se chama Inês.
“Sempre gostei do tema do ‘doppelganger,’ a ideia de alguém encontrar um duplo, uma pessoa que, sendo idêntica, é ao mesmo tempo o completo oposto: o gémeo louco, o clone descontrolado. A ideia assustadora de podermos encontrar os nossos sósias ou de atravessarmos o espelho e acedermos de alguma forma a uma versão alternativa de nós próprios”, explicou a escritora.
Há um momento em que Inês, a protagonista, se apropria de alguns pertences da outra Inês, deixados esquecidos no bar da praia, o que a leva a refletir sobre a sua identidade, sobre quem é o que quer ser.
“Queria aproximar-me do tema do duplo sem ter de atravessar um portal para outra dimensão, sem ter de transformar pessoas em monstros ou insetos. Ficamos sempre deste lado, com os pés no mundo real. Mas há uma ambiguidade que surge na história e que me cativou desde o início. Um fascínio verosímil, que não chega a cair na loucura. Acho eu!”, sublinha Ana Pessoa.
A narrativa decorre ao longo de um ano, entre o final de um verão e o começo de outro, entre o fim do trabalho de Inês na praia, o retomar de rotinas de escola, a relação com os amigos e com JP, e o regresso ao “Conchas” no ano seguinte.
Sendo as duas obras sobre adolescência – o território de eleição no trabalho literário de Ana Pessoa -, “Desvio” e “Mar Negro” têm abordagens diferentes.
“Enquanto no ‘Desvio’ estamos sempre dentro da cabeça do protagonista, no ‘Mar Negro’ não temos acesso a um único pensamento. (…) Enquanto o ‘Desvio’ era uma banda desenhada muito lenta, feita de contemplação, pausas, monólogos interiores e cenas meio paradas de um único protagonista, quase sempre sozinho, num cenário interior, (…) o argumento do ‘Mar Negro’ tem um ritmo muito mais acelerado e inclui bastantes personagens, muitos diálogos, muita ação e muitos cenários”, sublinha a autora.
Essa profusão de diálogos e cenas é sustentada por um trabalho visual a três cores – branco, azul e laranja - no qual Bernardo P. Carvalho propõe uma banda desenhada mais detalhada, angulosa, substituindo algumas pranchas tradicionais de quadrados e retângulos por sequências de triângulos.
Antes de “Mar Negro” e “Desvio”, Ana Pessoa e Bernardo P. Carvalho fizeram “O caderno vermelho da rapariga karateca” (2012), “Mary John” (2016), que inclui algumas páginas em registo de banda desenhada sem texto, e “Supergigante” (2017).
“Mar Negro”, o centésimo livro do projeto editorial Planeta Tangerina, será apresentado no dia 29, com a presença de Ana Pessoa, na livraria Culsete, em Setúbal.
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