As latas de “spray” já estão arrumadas, a grua também foi retirada, quando Sérgio Odeith, 39 anos, conta a experiência de pintar, em seis dias, um mural com “visibilidade bastante ampla”, junto à saída do metro de Amadora Este, na Falagueira.

“Em tempos, se calhar, tive mais tendência para desenhar artistas estrangeiros e, hoje em dia, já fiz vários artistas portugueses que acho que marcaram um pouco da nossa história”, explica à Lusa o “graffiter” natural da Damaia, que também pintou Amália e Eusébio.

Sérgio Odeith começou a pintar na rua e em linhas de comboios, trabalhou mais de uma década em tatuagens e deixou murais nos bairros da Cova da Moura, 6 de Maio e Santa Filomena, enquanto desenvolvia uma linguagem própria, com o “3D sombrio”.

“Mais ou menos em 2005 comecei a desenvolver esse estilo pintado em mais do que uma superfície, que é visto de um ângulo que cria um efeito que sai da parede, e tenho tido um pouco de reconhecimento lá fora”, admitiu, referindo-se aos trabalhos de arte anamórfica.

O mural do guitarrista, pintado na Rua António Duarte Caneças, foi pintado a “spray”, para resistir melhor ao sol e à chuva, e “as pessoas do prédio adoraram a ideia do Carlos Paredes”, por ser “uma pessoa a que ninguém fica indiferente” e “um símbolo nacional”, notou Odeith.

Os próximos tempos incluem outros murais e viagens, pelo México e Estados Unidos da América, nomeadamente Carolina do Sul e Kentucky, onde já possui registos da sua arte.

A alguns metros do mural de Carlos Paredes, André Calado (Nada) e João Henriques (Damn1) dão novas cores a um muro na Rua Manuel Ribeiro de Pavia.

“É sempre uma oportunidade de ver o meu trabalho numa outra escala e também num contexto que não é o habitual, no papel”, salienta Nada, natural da margem sul, e que participou no projeto “O Bairro i o Mundo”, na Quinta do Mocho, Loures.

No muro com 120 metros da Quinta do Estado, Nada e Damn1 desenvolveram “um diálogo” entre os seus estilos, que “tem muito a ver com a multiculturalidade da Amadora”, frisa André/Nada.

“Tentámos criar uma espécie de tribos, que suscitasse a diversidade, o diálogo intercultural, e foi por aí que decidimos abordar este muro”, vinca.

Noutro ponto da cidade, na freguesia da Venteira, Ana Dias e Elsa Pedrosa pintam um mural inspirado pelas ilustrações de Roque Gameiro e a cerâmica de Rafael Bordalo Pinheiro.

A intervenção no muro da Casa Roque Gameiro iniciou-se com um “workshop”, com a participação da comunidade local, e como adianta Ana Dias, a iniciativa visa “convidar artistas emergentes e dar-lhes uma oportunidade” de evocarem a obra de autores que retrataram “as gentes e o povo nas suas diversas profissões”.

O projeto “Conversas na Rua”, inserido nas comemorações dos 36 anos da cidade da Amadora, incluiu o “workshop” Graffiti na Rua, na Escola Profissional Gustave Eiffel.

A iniciativa, segundo Catarina Valente, comissária do projeto, procura “estabelecer um diálogo com as populações da Amadora e promover a multiculturalidade das suas comunidades”.

O vereador da Cultura na Câmara da Amadora, António Moreira (PS), sublinha que os “graffiti” não são “a única forma de arte urbana” na cidade, que além da escultura e da banda desenhada, conta com iniciativas de reabilitação urbana, “que também tem uma componente de arte pública”.

O autarca acrescenta que os três murais vão enriquecer o mapa do “graffiti” do município, criado para georreferenciar os principais trabalhos no concelho, onde já está representado Odeith com várias obras.