Ele é o médico rebelde, anti-social e por vezes irritante que adorava confundir a comunidade médica com os seus diagnósticos brilhantes e pouco ortodoxos.

Mas o Dr. Gregory House, o génio misantrópico que foi a estrela da longa série de TV "Dr. House", errou bastante, afirmam médicos croatas.

De um neurologista a trabalhar no lado errado de um paciente ao realizar uma colonoscopia, ou uma ressonância magnética feita por um profissionalo que claramente não é radiologista, os investigadores croatas contestam a precisão médica da série americana num artigo publicado este mês.

Denis Cerimagic, professor da Universidade de Dubrovnik, e dois colegas neurologistas — todos grandes fãs da série — listaram 77 erros após analisar todos os 177 episódios da série, transmitida de 2004 a 2012.

"Concentrámo-nos nos diagnósticos dos principais casos, na realidade da apresentação da prática clínica e na deteção de erros médicos", disse Cerimagic à France-Presse.

Ele e os seus colegas — Goran Ivkic e Ervina Bilic — dividiram os erros em cinco categorias, incluindo uso indevido de terminologia médica, desinformação e simplemente estranho — algo que possuía em abundância o anti-herói da série, interpretado pela estrela britânico Hugh Laurie.

Aquele coxear

Os erros incluem o uso de termómetros de mercúrio — que há muito tempo deram lugar aos digitais —, o uso dos termos ataque cardíaco e paragem cardíaca como sinónimos quando não são a mesma coisa, e que a deficiência de vitamina B12 pode ser corrigida com apenas uma injeção.

Também não existe uma quimioterapia universal para todos os tipos de tumores malignos, como sugeriu um episódio.

Mas, sem dúvida, o maior erro de todos é que Laurie — cujo génio de dedução da personagem vem do diagnóstico errado que o deixou a coxear e com dor crónica — usa a sua bengala do lado errado.

A bengala deveria ser utilizado do lado não afetado, disse Cerimagic, embora entenda a razão para o ator o ter feito, pois "é mais eficaz ver o coxear pronunciado na ecrã".

A pesquisa também descobriu procedimentos médicos realizador por especialistas que não deveriam estar presentes, como um infectologista a fazer uma autópsia.

Às vezes, a série também "esticava" a realidade para lá do limite, com exames laboratoriais complexos a produzirem resultados em poucas horas. E os médicos raramente se transformam em detetives e assumem a responsabilidade de entrar nas casas dos pacientes à procura de causas ambientais para as doenças.

Sem mencionar o comportamento antiético do Dr. House — "Tumor cerebral, ela vai morrer", diz ele num episódio, segundo o artigo — e o vício da personagem em opiáceos.

Os investigadores afirmam que podem ter deixado passar outros erros.

"Somos neurologistas, pelo que outros especialistas médicos certamente identificariam erros adicionais", acrescentou Cerimagic.

Erros médicos

Independentemente das críticas, os investigadores afirmam que as séries médicas modernas são muito melhor produzidas do que no passado, graças aos consultores médicos.

Não é como há cerca de 20 anos, quando os médicos olhavam para radiografias de cabeça para baixo, diz o neurologista.

"Mas apenas profissionais médicos conseguem perceber erros", nota.

Apesar das falhas, os investigadores pensam que a série poderia ser usada para auxiliar no treino de estudantes de medicina.

"O foco poderia ser no reconhecimento de erros médicos no contexto de episódios individuais, adotando o conceito de trabalho em equipa e uma abordagem multidisciplinar no diagnóstico e tratamento", diz Cerimagic.

O médico diz que ele e os seus colegas ficaram surpreendidos com a resposta ao artigo "House M.D.: Between reality and fiction" ["Dr. House: Entre a realidade e a ficção] — que não é o primeiro estudo académico a colocar em causa o bom médico e os seus métodos.

"A ideia era tornar um artigo científico interessante não apenas para os médicos, mas também para as pessoas sem conhecimento médico específico."