
Um concerto que ficou longe de encher o Coliseu, mas que esteve cheio de conhecedores e fãs da voz enigmática de Stuart A. Staples e do intimismo da música dos Tindersticks.
Um espetáculo que teve direito a duas partes: um primeiro ato especial, feito pelos próprios Tindersticks, que, na continuação para o segundo ato, fizeram-nos recordar os bons momentos da banda e os bons momentos dos vários espetáculos que já deram entre nós.
O facto do último disco ser, mais do que uma compilação, um trabalho de novas versões para canções de álbuns anteriores, não foi suficiente para trazer muita gente ao Coliseu, com esta Across Six Years Leap Tour a pedir, talvez, uma sala mais pequena. Mas, ainda assim, em nenhum momento se sentiu qualquer distanciamento entre público e músicos: estes, embevecidos pelo entusiasmo dos seus ouvintes; aquele eufórico com algumas surpresas.
Passava um minuto das 21 quando os nove músicos subiram ao palco. Cordas, metais, guitarras, percussão e bateria acompanharam Stuart A. Staples durante as mais de duas horas de concerto. “Tindersticks” (1993); “Tindersticks (1995); “Curtains” (1997); “Simple Pleasure (1999); “Can Our Love...” (2001); “Waiting For the Moon” (2003); “Lucky Dog Recordings 03-04” (2005); “The Hungry Saw” (2008); “The Something Rain” (2012) e o mais recente “Across Six Years Leap” foram os trabalhos percorridos ao longo da noite.
“Tricklin", de “Can Our Love...”, foi o ponto de partida, numa primeira parte em que Stuart A. Staples atuou sempre sentado e num registo mais de concerto ‘só para amigos’. “Marseilles Sunshine”, “A Night so Still”, “Hushabye Mountain”, “Come Feel the Sun”, “Friday Night”, que abre o mais recente trabalho; “She’s Gone” e “Dancing” foram os oito temas picados a vários álbuns e que cumpriram bem a sua função de despertar e aquecer o público, que foi profícuo nas suas demonstrações de carinho, embora tenha, por vezes, exagerado no pedido constante de temas mais conhecidos.
Na segunda parte, o arranque com “Sometimes It Hurts”, do álbum “Waiting for the Moon”, revelou que este seria um ato mais animado, menos intimista do que o primeiro. Acompanhado pela voz de Gina Foster, Staples, agora de pé, soube contrabalançar a energia de alguns momentos com outros, mais tranquilos, em que parecia estar a cantar na nossa sala.
Seguiram-se “If You Are Looking for a Way Out”, “Another Night In” – com o público a aplaudir entusiasticamente este tema, aliás, como a grande maioria dos temas que saíram do álbum do ano passado, “The Something Rain” –, para entramos em “Say Goodbye to the City” e “Sleepy Song”.
Com uma formação diferente da original, os Tindersticks parecem estar ainda a encontrar uma harmonia entre as canções de sempre e estas novas mãos que as acompanham. Mas a parte instrumental, a cargo de Neil Fraser (guitarra), Andy Nice (violoncelo), Terry Edwards (trompete), Dave Boultar (teclas), Dan McKinna (baixo, voz), Earl Harvin (percussão, bateria), mais violino e saxofone, foi um dos pontos mais fortes deste espetáculo. A voz marcante de Stuart A. Staples não chegou, por oposição, nas melhores condições a quem se encontrava, por exemplo, nos camarotes, onde nem sempre se ouvia as suas palavras e as de Gina Foster, em alguns momentos, pareciam sair para um microfone desligado.“Dying Slowly”, “Show Me Everything”, “This Fire of Autumn” e “Medicine” foram as canções que se ouviram de seguida.
“City Sickness”, com a bateria e a guitarra a quebrarem com o ritmo mais calmo que reinou durante a noite, “I Know That Loving”, “A Night In” e “My Oblivion” foram as canções que fecharam o concerto, com esta última a arrancar muitos suspiros.
Mas porque não há duas sem três, e porque o público conseguia valer por uma sala bem cheia, Stuart A. Staples e a sua banda voltariam para fazer as delícias dos seus fãs com“Travelling Light”, num maravilhoso diálogo entre Gina Foster e Staples, para depois entramos num dos momentos mais ‘pop’ da noite, com a banda a puxar o público para bater palmas ao som de “Can We Start Again?”. Acima das vozes do palco, ouviam-se as vozes do público que, depois do registo smoky do concerto, parecia querer libertar alguma da energia.
Para último, ficou “My Sister”, do segundo álbum homónimo da banda, de 1995, e na qual, durante cerca de oito minutos, Staples conseguiu mostrar por que a sua voz é perfeita para a música que os Tindersticks fazem. Talvez uma sala mais pequena, como a Aula Magna, conseguisse ampliar a emoção que se viveu sábado à noite no Coliseu dos Recreios, e, ao mesmo tempo, concentrar ainda mais o carinho que o público demonstrou ao longo da noite. Mas, na magia do Coliseu, os magos souberam estar à altura.
Texto: Helena Ales Pereira
Fotografia: Ricardo Junqueira
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