O Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, encheu no sábado para receber mais uma vez a cantora cabo-verdiana Mayra Andrade. Uma noite fria que rapidamente começou a aquecer quando Cati Freitas, a cantora responsável pela primeira parte do concerto, terminou a primeira música.

Acompanhada por Miroca Paris, na percussão, e Ruben Alves, no piano, a cantora trouxe canções de sua autoria e que revelaram um pouco do seu disco, “Dentro”. Com um som intimista, mas ritmado, e com uma voz melódica, mas muito poderosa, Cati Freitas rapidamente conquistou quem a ouvia.

Agora sim, estavam todos prontos para receber a estrela da noite. Mayra Andrade surge num vestido preto e de pronto começa a embalar a plateia com a leveza e alguma timidez que sempre a caracterizaram. “A –Mi N Kre-u Txeu” e “Ilha de Santiago” são os temas que iniciam a noite, apresentando um pulsar diferente na música de Mayra Andrade, um groove novo e uma nova banda. Apesar das muitas novidades, desde cedo percebemos que a identidade da cantora mantém-se.

Sente-se que este é um momento e um palco importante para Mayra Andrade. Ao fim de duas músicas, a cantora mostra-se emocionada e grata pela recepção que está a ter. E a partir daqui solta-se mais, podemos vê-la dançar, muito graças sonoridade mais reggea de “Les Mots D’Amour”.

Até ao sexto tema estamos entregues a canções do novo disco de Mayra, “Lovely Difficult”. É tudo muito recente, por isso sentimos de certa forma que o público ainda está expectante. Mas eis que chega “Tunuka”, um dos maiores sucessos da carreira da artista e se torna num dos momentos altos da noite. A resposta da sala é imediata, o público canta e acompanha com palmas. Os aplausos foram tantos que a cantora ameaçou repetir a canção.

“Tunuka” serviu de catalizador, porque mesmo regressando ao “Lovely Difficult”, ao som de “Ténpu Ki Bai”, o público não mais deixou de se entregar. “Ténpu Ki Bai” é uma canção intensa, cheia de dinâmicas e que com a entrega de Mayra e da sua banda recebeu uma das maiores ovações da noite.

A química entre a cantora e o público era notória e isso pôde ver-se ainda mais em “We Used To Call It Love”. Um excelente tema ao vivo e que permitiu que a cantora interagisse ainda mais com a plateia.

“Dimokransa” surgiu mais tarde nesta noite com uma nova roupagem, mas não isso que impediu que as pessoas vibrassem e aplaudissem esta versão.

A energia dentro do CCB era fantástica: em palco a banda dava o máximo e o público não escondia o seu agrado, visível quando Mayra apresentou a sua equipa. A cantora pôde sentir o amor da plateia quando seu nome foi fortemente aplaudido.

A bandeira de Cabo Verde voltou a ser levantada, foram várias as músicas cantadas em crioulo e que descrevem a vida nas ilhas, mas faltava uma para terminar a noite, “Tera Lonji”. Assim fechava, ou pensávamos nós, o concerto. Mas o público rendido e entusiasmado aplaudiu em pé, fazendo com que Mayra Andrade voltasse ao palco para o “encore”.

Este regresso ficou logo marcado com uma dedicatória: a artista cantou “Meu Farol” para a sua mãe que se encontrava na sala. “Lua”, um dos muitos pedidos da noite, foi também um dos temas deste encore, não poderia ficar de fora. E mesmo depois de satisfeito o desejo, de as luzes da sala estarem acesas, uma plateia em pé aplaude e volta a chamar por Mayra, que desta vez se deixa ficar só em palco, e, sem apoio da banda, canta “Mar Azul”, que dedica com muita emoção a Cesária Évora. Um final perfeito.

Esta nova fase da carreira de Mayra Andrade traz consigo novas sonoridades, novas referências, uma nova banda. Este novo rumo pode parecer difícil de aceitar para alguns, mas é tão bom de se ouvir. Há menos de Cabo Verde, mas a verdade é que a língua e a vivência crioula continuam a fazer parte de uma artista que não tem medo de romper com as expectativas e buscar um novo destino.

Texto @Edson Vital/ Fotos @Inês Alves/SAPO CV