A voz de Frank Sinatra, falecido em 1998, é encontrada numa versão do tema "Gangsta's Paradise", de Coolio, e Angèle teve a surpresa de se a ouvir a cantar "Saiyan", canção dos rappers franceses Heuss L'Salaud e Gazo. O vídeo foi visto mais de 1,8 milhão de vezes no YouTube.

"Não sei o que pensar da inteligência artificial. Parece-me uma loucura, mas, ao mesmo tempo, temo pela minha profissão", escreveu a cantora belga nas suas redes sociais.

"A IA está em toda a parte, a todo momento. Seja nas reflexões da indústria musical ou na arte. É mais visível do que antes, porque a tecnologia se democratiza", explica à AFP Alexandre Lasch, do Sindicato Nacional da Edição Fonográfica de França (SNEP).

"À medida que as aplicações são desenvolvidas, a regulação é discutida a nível europeu. Nos Estados Unidos, a maior preocupação é a transparência com as ferramentas da IA, porque o mais importante continua a ser o respeito ao artista e à criação", acrescenta.

Raiva contra a IA

"A IA é demoníaca", afirmou o rapper californiano Ice Cube no podcast Full Send. "É a gota d'água", lamentou o rapper canadiano Drake, que se considera afectado por processos que imitam o timbre da voz.

Por exemplo, a voz do rapper é usada numa versão de "Munch", canção da rapper norte-americana Ice Spice, ou em "Heart On My Sleeve", falsa colaboração criada com The Weeknd, ouvida mais de 10 milhões de vezes no TikTok em poucas horas.

E a propriedade intelectual? "O que proteges com os direitos de autor é a expressão de uma ideia. A voz não é realmente isso", avalia Andrés Guadamuz, professor de Direito de propriedade intelectual na universidade britânica de Sussex.

Fenómeno "interessante"

Um álbum inteiro dos Oasis, grupo que se separou em 2009, apareceu rebaptizado de AIsis (AI por inteligência artificial em inglês). "Ouvi apenas uma canção", comentou nas suas redes o cantor Liam Gallagher, "e era melhor do que outras que ouvi ultimamente".

Paul McCartney qualificou o fenómeno de "muito interessante" na BBC Radio 4. "É algo que todos (nós) estamos compreendendo neste momento", destacou.

O britânico mencionou o caso de uma canção inédita dos Beatles que será gravada usando a IA para recriar a voz de John Lennon, sob controlo dos seus herdeiros.

Por outro lado, o Spotify "está a promover discussões sérias sobre como gerir o poderoso potencial das tecnologias IA", afirmou à AFP um porta-voz da plataforma de streaming.

Em junho, a plataforma Deezer indicou ter desenvolvido uma tecnologia que a permite identificar as canções que clonam as vozes das estrelas da música através da IA.

"O nosso objetivo é eliminar os conteúdos ilegais e fraudulentos, aumentar a transparência e desenvolver um novo sistema de remuneração no qual os artistas profissionais sejam recompensados pela criação de conteúdos valiosos", afirmou em comunicado.

Desde abril, a Universal Music pede a plataformas como Spotify e Apple Music que impeçam o acesso ao catálogo todos aqueles que desejam utilizá-lo para enriquecer os programas de IA, informou o jornal Financial Times.

Além disso, Google e Universal Music estão a negociar o possíveis licenças para as melodias e vozes de artistas geradas com a IA, segundo a mesma publicação.

A ideia é definir ferramentas para poder recompensar os herdeiros quando os fãs criarem obras dos seus ídolos com programas de IA.