Após um hiato de aproximadamente uma década, a banda do filho de Charlie Haden, malogrado contrabaixista jazz, acordou de uma morte prematura e regressou aos discos com “The Soul Of Spain” (2012). No entanto, este retorno tem vindo a ser essencialmente marcado por um reconhecimento do passado, mais propriamente do material responsável pela apoteose dos Spain, logo ao primeiro disco, “The Blue Moods Of Spain” (1995). Conforme já nos havia prometido em entrevista, de modo a agradecer aos fãs de sempre e a dar a oportunidade aos novos de poderem ouvi-lo ao vivo, nesta digressão, o álbum tem vindo a ser tocado na íntegra e pela ordem em que foi gravado.

Assim sendo, num concerto dividido em duas partes, “The Blue Moods Of Spain” surgiu quase a eito, salvo silenciosas pausas para afinações, num alinhamento que foi deixando de ser surpresa aos ouvidos mais atentos. It's So True foi o óbvio pontapé de partida, revelando uns Spain que, excetuando alguns sorrisos mal contidos do guitarrista Daniel Brummel, adotaram uma postura mais circunspecta, compenetrada e algo envergonhada. Numa progressão óbvia, sucederam-se Ten Nights, Dreaming of Love e Untitled #1, lideradas por um Haden introspetivo, de olhos fechados enquanto cantava e tocava baixo, incapaz de encarar ou de se dirigir à audiência nos intervalos entre as canções. Mesmo antes do quinto tema, Her Used-to-Been, alguém decidiu verbalizar o constrangimento que entretanto se veio a apoderar da salacom um gozão “Boa Noite!”, que arrancou algumas gargalhadas do público, mas que nem assim foi capaz de demover Haden do pedestal conceptual onde supomos que se encontrasse, durante a investida nos tempos áureos.

Matt Mayhall, na bateria, deu início a Ray of Light para que depois, a comprovar as habilidades da nova formação (que em palco conta com a guitarra extra de Dylan McKenzie), World of Blues tivesse fluído num entrosamento de cordas em distorção. A findar o primeiro ato, I Lied e Spiritual - oração dos tempos modernos, cujo misticismo melódico fora assegurado pelas teclas do (também guitarrista) Randy Kirk – deram azo, finalmente, às primeiras palavras faladas por Haden, que anunciaram um intervalo dedez minutos.

De volta ao palco, a segunda metade da noite desenrolou-se não só em torno do último registo de originais, contrariamente ao que seria de prever, como contemplou de igual modo “She Haunts My Dreams” (1999) e “I Believe” (2001), os dois álbuns que sucederam ao primeiro. A sonoridade manteve-se concordante, coesa nas atmosferas densas, envoltas na suavidade vocal de Haden. Our Love Is Gonna Last Forever ameaçou concluir esta noite de estranheza, por entre a devoção do público e os silêncios prolongados do vocalista, que regressou ao palco para um pequeno encore com Nobody Has to Know.

Texto: Ariana Ferreira

Fotografias: Filipa Oliveira