Os góticos sempre gostaram de tempestades. Assim, não podia haver queixas no momento que uma multidão vestida de negro saudou a entrada dos Evanescence em cena, também eles de roupas escuras - e os longos cabelos de Amy Lee chegavam à cintura.

Começa tudo escuro, quando a vocalista surge subitamente, introduzindo os primeiros sons de “Artefact”. Em 2017, o grupo norte-americano beneficiou de uma onda revivalista, ainda que com orquestras a acompanhar as suas canções mais antigas. Mas se “Fallen”, de longe o ponto da carreira mais reverenciado pelo público, já faz quase 20 anos, o concerto de ontem teve como mote a apresentação do álbum “The Bitter Truth”, editado no ano passado. Quase metade do alinhamento veio daí.

Por falar em amargura, não faltaram tragédias recentes: a cantora perdeu o irmão mais novo, o baixista Tim McCord foi obrigado a despedir-se da sua filha de 16 anos - ambas mortes súbitas. O confinamento da era COVID-19 também deixou marcas e, se as letras de Amy Lee nunca foram uma ode à alegria, os seus devaneios de solidão e luto aparecem aqui talvez com mais propriedade e menos fantasia.

“There’s no way back this time / What is real and what is mine (...) / Survival hurts / But I keep breathing in (I´m alive)” - canta ela na abertura com “Broken Pieces Shine”. Até porque, 20 anos depois de “Fallen”, as princesas já não encantam como antes: no videoclip de “Bring Me to Life”, a “lady” de branco caía no infinito à espera do resgate (de um príncipe?) que a trouxesse de volta à vida. Assim e de modo genérico, “The Bitter Truth” é uma longa litania onde a autora se convence a não desistir e a manter-se na luta.

De resto parece que de vez em quando Amy Lee quer convocar a revolução (o público concorda e, provavelmente, filma o momento), noutra altura relembra aos fãs que “ninguém está sozinho - basta olhar para o lado” - o que equivale a dizer que o concerto dos Evanescence é uma celebração coletiva.

Apesar de a maior parte das canções ser de um álbum menos conhecido, a adesão é simpática - mas é óbvio que os instantes de maior interação são as quatro de “Fallen” (“Going Under", “Imaginary”, “My Immortal”, “Bring me to Life”) e “Call Me When You’re Sober” - o grande “hit” de “The Open Door”. Neste mesmo álbum, aliás, Amy Lee sonhou com Lisboa e trouxe para o alinhamento “Your Star” - e o seu verso “The mechanical light of Lisbon frightened away” - para festa dos fãs.

A vocalista pendura uma bandeira LGBT para “My Immortal” (outra vez a convocar “smartphones”) e “Bring Me to Life” aparece para encerrar os trabalhos sem substituição para a poderosíssima voz de Paul McCoy no original. Lá fora teria dado jeito que a tempestade tivesse ficado pelos contos de fada góticos, mas não: chuvas torrenciais aguardavam o público que tinha lotado o espaço numa noite inóspita.

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