"Não importa o que aconteça, foco-me no trabalho", disse o cineasta americano Woody Allen, que começa esta quarta-feira a rodar o seu novo filme em San Sebastián, no país basco espanhol, uma homenagem ao cinema, afastado da polémica dos alegados abusos sexuais que o persegue nos EUA.
"Foco-me no trabalho e isso é o que realmente absorve o meu tempo e esforços", disse o cineasta veterano de 83 anos em conferência de imprensa na terça-feira ao ser questionado sobre o movimento #MeToo, que deu novo impulso às antigas acusações da sua filha adotiva, Dylan Farrow.
"Não penso nos movimentos políticos ou sociais, não estou equipado mentalmente para ter muito conhecimento sobre essas coisas", disse.
Woody Allen também foi questionado sobre se pensou em reformar-se por causa da polémica.
"A minha filosofia sempre foi que, não importa o que aconteça, temos de nos manter concentrados e no trabalho e continuar a trabalhar, sem importar o que aconteceu na nossa vida, família, filhos e políticas. Provavelmente vou morrer no meio da preparação de uma sequência", salientou.
Allen sempre negou as acusações de ter abusado de Dylan quando ela tinha sete anos, no início dos anos 1990.
Na época, duas investigações não encontraram provas suficientes para incriminá-lo, mas Dylan, apoiada pela sua mãe adotiva (e ex-mulher do cineasta), a atriz Mia Farrow, e seu irmão, Ronan, renovou as suas acusações à luz do movimento #MeToo contra o assédio.
A polémica deteriorou a imagem de Allen, levando vários atores com quem tinha trabalhado a distanciarem-se dele e a Amazon a romper um contrato milionário para produzir e distribuir quatro filmes. O realizador recorreu para os tribunais e pede ao gigante da distribuição uma indemnização de 68 milhões de dólares.
A sua longa-metragem "Um Dia de Chuva em Nova Iorque", parte desse acordo, ficou num limbo nos EUA, mas estreará nos próximos meses em salas de cinema de alguns países europeus, nomeadamente em Portugal a 24 de outubro.
- "Homenagem aos grandes cineastas"
Neste contexto adverso, o filme que Woody Allen começa a filmar em San Sebastián a partir desta quarta-feira e até 20 de agosto representa uma lufada de ar fresco para o vencedor de quatro Óscares, com meia centena de filmes no currículo.
Ainda sem título, a comédia romântica, que estreará no ano que vem, girará à volta do Festival de Cinema de San Sebastián, explicou o realizador.
Protagonizado por Christoph Waltz (ausente da conferência de imprensa), Wally Shawn, Gina Gershon, Elena Anaya e Sergi López, será uma "homenagem aos grandes cineastas e a grandes filmes que emergiram através da história dos festivais de cinema", esclareceu.
A apresentação esta terça-feira decorreu no Kursaal, o emblemático palácio que durante todo o mês de setembro recebe o Zinemaldia, o Festival de San Sebastián, que em 2004 entregou a Allen o prémio honorário Donostia pela sua carreira.
Na conferência de imprensa, Allen elogiou os festivais de cinema que "sempre prestaram homenagem a cineastas especiais que entendiam o cinema como uma forma de arte", apesar de admitir estar "preocupado com o facto de que hoje em dia os festivais se preocupam muito com as estrelas, a publicidade e o aspecto comercial dos filmes".
O filme, que mostrará cenários icónicos de San Sebastián, como a praia de La Concha, é produzido pela Mediapro, que já financiou no passado os filmes de Allen "Vicky Cristina Barcelona" (2008) e "Meia-noite em Paris" (2011).
Trump gerou as melhores sátiras dos EUA dos últimos anos
Woody Allen também falou de presidente Donald Trump e comentou que a sua administração melhorou a qualidade do humor satírico no seu país.
Segundo ele, apesar de tudo, "as pessoas querem rir".
"Houve tantas críticas e reclamações" em relação ao governo Trump, "que se gerou o melhor e mais imaginativo humor satírico em anos nos EUA", acrescentou.
"Às vezes, a tensão nervosa e os eventos complicados fazem rir com mais facilidade", recordou.
"A comédia funciona em todo o lado e sob qualquer circunstância, seja a provocar um riso aberto ou nervoso", concluiu.
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