Dominado por monstros marinhos e paisagens idílicas de uma Itália costeira inspirada pelos anos 1950 e 1960, "Luca" é uma história de amizade com a entrada na adolescência no centro, a partir das aventuras de dois rapazes que também são criaturas aquáticas (ou vice-versa).

A 24.ª longa-metragem da Pixar não passou pelas salas de cinema e chega diretamente ao serviço de streaming Disney+, mas não defrauda a herança exigente dos estúdios de animação através de uma sensibilidade emocional e sobretudo de um esplendor visual que dão brilho à história de Luca e Alberto.

"Gostámos que a ideia de um monstro marinho pudesse ser uma metáfora de tantas coisas. Como ser um adolescente ou pré-adolescente. Aquela fase em que nos sentimos estranhos", assinala Enrico Casarosa num encontro virtual com meios internacionais no qual o SAPO Mag esteve presente. "Há várias maneiras de nos sentirmos diferentes. Pareceu-nos uma forma maravilhosa de falar disso e da ideia de nos aceitarmos, independentemente da forma como nos sentimos diferentes".

No seu novo filme, a Pixar vai até à Itália para viver um verão inesquecível de dois rapazes

Mas antes do contraste com a diferença, o maior entrave do protagonista até começa por estar nas suas próprias inquietações. "Um dos meus elementos favoritos é a forma como o filme fala das vozes da nossa cabeça. Não sei quanto a vocês, mas eu ouço-as muito. A insegurança, as vozes que nos dizem 'Não, não podes'", explica. "Mas também não queríamos fazer psicologia pop" [risos].

A solução encontrada para abordar os acessos de ansiedade surgiu a partir da personagem de Alberto, figura que incita a jornada do protagonista no filme e que repete a expressão "Silêncio, Bruno!". "Foi criada pelo Jesse Andrews, o nosso fantástico argumentista, que escreveu 'Me and Earl and the Dying Girl', filme que adorámos", salienta. "E até é um bom conselho - 'não ligues às vozes da tua cabeça', mas expresso de uma forma muito louca, à maneira do Alberto. Foi um modo divertido de concentrar essa ideia apenas numa frase".

O conselho, no entanto, não é só para os mais novos. "Espero que os miúdos, ao verem o filme, não se esqueçam deste conselho ao crescerem. Seria ótimo vê-los questionar essas vozes e decidir quando tomar riscos nas suas vidas. Mas com as nossas desculpas a todas as pessoas chamadas Bruno" [risos).

LUCA

O realizador admite que também não foi imune a algumas dessas vozes durante a criação de "Luca". Afinal, esta é a sua primeira longa-metragem, que surge depois de ter colaborado noutros filmes de animação como "Up - Altamente!" ou "The Incredibles 2: Os Super-Heróis" e de ter sido nomeado para os Óscares pela curta "La Luna", em 2012.

"Posso assegurar que tive muitos momentos 'Silêncio, Bruno!', síndrome do impostor, dúvidas e dificuldades. Sendo completamente honesto, criámos "La Luna" sem qualquer esforço. De alguma forma, surgiu facilmente. Este é um puzzle maior, muito mais trabalho, uma longa maratona. E muito mais difícil", compara. "Cais, levantas-te e continuas a correr. Mas isso torna tudo melhor quando alcanças a meta".

Calar o Bruno e chamar pelo Alberto?

Não faltou quem se lembrasse de outro relato de cumplicidade masculina num cenário italiano veraneante e nostálgico quando surgiram as primeiras imagens promocionais de "Luca". Nas redes sociais, houve quem questionasse se não estaria aqui uma resposta da Pixar a "Chama-me Pelo Teu Nome" (2017), drama do também italiano Luca Guadagnino centrado numa relação homossexual. Poderia "Luca" ser a primeira longa-metragem LGBTQI+ dos estúdios de animação, depois da curta "Sair", de Steven Clay Hunter (estreada no ano passado e também disponível no Disney+)?

Enrico Casarosa diz que ainda não é desta. "Queria muito falar sobre a amizade antes de as namoradas ou os namorados entrarem em cena para complicar as coisas", esclarece. "Este é um tipo de amizade que te mete em problemas, obriga-te a mudar e a encontrares-te. Também sinto que é aquele momento da vida em que deixas a bolha da família - ela não vê o Luca, só a avó é que o vê um bocadinho. Por isso, queríamos ter a certeza que eles se viam um ao outro, que acrescentavam alguma coisa um ao outro, e que o Luca estava a ver e a reconhecer o Alberto. São ambos solitários".

LUCA

Além da dupla masculina, há uma jovem figura feminina que traz outra dinâmica ao filme: Giulia, decisiva para que os dois pequenos monstros marinhos se infiltrem no mundo dos humanos. "Quando ela entrou em cena, a estrutura narrativa quase se encaminhou para algo próximo do romance, mas queria mesmo falar de amizade. Mas a Giulia também é um pouco solitária, por isso há um pequeno espaço que pode ser preenchido por novas amizades", observa.

"Queríamos falar do quão difícil é ter amizades fortes e significativas hoje em dia e de como as diferenças nos desafiam", reforça. E algumas das primeiras reações sugerem que a viagem de regresso à infância foi bem-sucedida. "Houve muitas pessoas que nos disseram 'Oh, eu tive um Alberto'".

TRAILER DE LUCA:

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