"São Jorge", que valeu a Nuno Lopes o prémio de melhor ator no Festival de Veneza do ano passado, conta a história de Jorge, um pugilista, desempregado, que aceita trabalhar numa empresa de cobranças difíceis para pagar as suas próprias dívidas e para tentar que a mulher e o filho não emigrem.

"Para a minha geração foi um momento muito marcante, o momento da crise, o momento em que sentimos o país a afundar. (...) Era um momento decisivo em que a própria soberania do país era posta em causa, a própria vontade dos cidadãos de atuar sobre a sua vida estava condicionada por uma vontade externa", afirmou o realizador, a propósito das medidas de austeridade impostas pela 'troika' (Banco Central Europeu, Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional).

"São Jorge" começou por ser uma ideia de um filme de ficção sobre boxe, burilada entre o realizador e Nuno Lopes, que já tinham trabalhado juntos em "Alice", de 2005.

No processo de pesquisa, falando com pugilistas, visitando bairros sociais, perceberam que havia outras camadas, da vida dos portugueses, que se sobrepunham à ideia de fazer um filme de género sobre boxe.

"Há uma história de ficção que se vai cruzando com o documentário da própria crise. (...) É um filme muito burilado, muito trabalhado ao longo de quatro anos. É um filme que foi ganhando densidade à medida que a crise ia avançando", explicou Marco Martins, que já não fazia um filme de ficção desde "Como desenhar um círculo perfeito", de 2009.

O filme conta com atores profissionais como Nuno Lopes, José Raposo, Mariana Nunes, Gonçalo Waddington e Beatriz Batarda, mas também não-atores, a quem é dada voz para falar sobre crise, desemprego e falta de dinheiro.

"Havia um hiato enorme entre o que se ouvia falar sobre a crise, nos telejornais e nas rádios, e aquilo que víamos todos os dias nos bairros sociais. Quisemos falar sobre esse hiato e quisemos pôr rostos e dar voz. (...) O filme não procura dar uma resposta sobre o que deveria ter sido feito, mas aponta claramente um problema entre o que existia nas notícias e a realidade", afirmou Nuno Lopes à agência Lusa.

Para ambos, "São Jorge" é também uma metáfora sobre a situação de Portugal face a instituições financeiras internacionais.

"O facto de estarmos a falar de um filme sobre um cobrador de dívidas, que anda a cobrar a pessoas que estão na mesma situação que ele, [tem a ver] com o que nos estava a acontecer com o FMI", sublinhou o ator. "Essa metáfora estava desde o início", corroborou o realizador.

Quanto a expectativas de espectadores sobre "São Jorge", Marco Martins afirma: "É um filme histórico que, de alguma forma, vai levar as pessoas a refletir sobre aquele momento. O filme coloca uma reflexão interessante sobre o nosso país".

"O filme é sobre uma realidade que toda a gente conhece. Não há ninguém que não tenha um familiar que tenha emigrado por causa da crise ou tenha sido despedido. Toda gente sabe do que é que estamos a falar e depois é sobre uma história universal de amor de um pai por um filho", disse Nuno Lopes.

Dias depois da estreia nacional, em mais de 20 salas de cinema, o filme deverá ainda ter duas projeções especiais nos bairros da Boavista e da Jamaica, onde foi rodado.

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