Enquanto Los Angeles é assolada por incêndios florestais que lembram um filme-catástrofe de Hollywood, a vasta indústria do entretenimento da cidade já está a contabilizar os custos de mais um revés drástico que os seus trabalhadores não podem suportar.

Atores, técnicos, argumentistas e produtores perderam as suas casas; as produções cinematográficas e televisivas foram temporariamente interrompidas; e aumentam os pedidos para que a temporada de prémios de Hollywood seja cancelada.

A situação surge num momento em que o setor do entretenimento de Los Angeles – que vale 115 mil milhões de dólares para a economia da região (112,64 milhões de euros, à cotação do dia) – já se encontra numa situação difícil, à medida que algumas produções cinematográficas e televisivas abandonam a cidade devido aos elevados custos. A pandemia de COVID-19 e as recentes convulsões laborais também tiveram os seus efeitos nos últimos anos.

“Hollywood, como toda a gente, foi atingida pela pandemia com graves consequências. As greves [dos atores e argumentistas em 2023], obviamente, afetaram a indústria, provavelmente para sempre”, disse à agência France-Presse (AFP) Marc Malkin, editor sénior de cultura e eventos da revista especializada Variety.

"Adicione-se a isso os incêndios e Hollywood está simplesmente a ser repetidamente atingida."

Estrelas como Anthony Hopkins, Mel Gibson e Billy Crystal perderam as suas casas devido aos incêndios da semana passada.

Mas isso é apenas a ponta do icebergue, com milhares de casas destruídas numa cidade que alberga 680 mil pessoas empregadas na indústria do entretenimento ou em empregos de serviços que a apoiam diretamente. Pelos menos 24 pessoas morreram e dezenas estão desaparecidas. Gavin Newsom, governador do Estado da Califórnia, diz que pode ser o pior desastre natural na história dos EUA.

Uma vista dos restos de casas destruídas pelo incêndio no bairro de Pacific Palisades, em Los Angeles

"Anatomia de Grey", "NCIS", "Hacks" e "Fallout" estão entre mais de uma dúzia de produções de TV de Los Angeles cuja rodagem foi interrompida desde o início dos incêndios.

Partes da cidade onde estão localizados os principais estúdios, incluindo Burbank, foram ameaçadas pelos incêndios, mas têm sido poupadas até agora.

Mas a Film LA, que gere as autorizações para a rodagem ao ar livre de filmes e séries, alertou os produtores que trabalham nas zonas de evacuação ou nas imediações para "esperarem a ter a sua licença cancelada" e avisou outros que haverá escassez de supervisores de segurança nos 'sets'.

Com o denso fumo e a fuligem a cobrir toda a região, até mesmo as produções que desejam filmar mais longe são afetadas.

“Não é bom se estiver a filmar agora ao ar livre em Los Angeles. A qualidade do ar é muito má”, disse Malkin.

Brilho e glamour

Ainda não há informações sobre quando serão retomadas as produções. Além das muitas questões logísticas, a indústria tem de ponderar a perspetiva que dará se voltar à normalidade enquanto áreas de Los Angeles estão em chamas.

Em nenhum lugar esta questão é mais delicada do que com a atual temporada de prémios de Hollywood – uma série interminável de estreias, galas e cerimónias que está atualmente suspensa.

Eventos como os Critics Choice Awards foram adiados, e estreias em Los Angeles de filmes como "The Last Showgirl", com Pamela Anderson, e o 'biopic' "Better Man", sobre Robbie Williams, foram canceladas na semana passada.

Os cancelamentos estenderam-se até mesmo a Nova Iorque, onde foi abortada a antestreia da série de sucesso da Apple TV “Severance”.

“Os estúdios, as plataformas de streaming, estão a ter a resposta certa ao cancelar ou adiar eventos de brilho e glamour”, disse Malkin.

“Ter as pessoas na passadeira vermelha, cheias de brilho e glamour enquanto Los Angeles está literal e figurativamente em chamas... seria um pouco desconcertante ouvir as pessoas a falar sobre o que estão a vestir ou aquela 'história pateta da rodagem'."

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Até foi adiado o anúncio televisivo das nomeações aos Óscares.

“Muitos dos nossos membros e colegas da indústria vivem e trabalham na área de Los Angeles, e estamos a pensar em vocês”, escreveu o presidente executivo da Academia Bill Kramer numa mensagem aos membros.

Jean Smart, protagonista de “Hacks”, defendeu ser dado um passo à frente e descartar toda a temporada.

“Durante a temporada de prémios de Hollywood e com TODO o respeito , espero que qualquer um dos canais que transmitam os próximos prémios considerem seriamente NÃO transmiti-los e doar a receita que teriam obtido às vítimas dos incêndios e aos bombeiros”, escreveu no Instagram.

Embora poucos na 'Tinseltown' estejam com vontade de comemorar, Malkin alertou que o cancelamento de toda a temporada teria efeitos devastadores sobre cabeleireiros, caracterizadores, empregados de restaurantes, motoristas e pessoal de segurança.

“Sim, financeiramente as estrelas vão ficar bem”, disse.

"Mas quando se pensa em todas as pessoas que trabalham nestes diversos prémios, esses são trabalhadores temporários que dependem desses cheques... teria um efeito devastador.", contrapõe.