A direção do DocLisboa revelou hoje os primeiros filmes da programação da 20.ª edição e, entre eles, está o documentário "O que podem as palavras", das realizadoras Luísa Sequeira e Luísa Marinho.

"O filme coloca as escritoras portuguesas Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa em diálogo, enquanto refletem sobre o processo criativo e o impacto da singular obra literária 'Novas Cartas Portuguesas' nas suas vidas e no movimento feminista no contexto internacional", refere a sinopse.

O documentário, que cruza imagens de arquivo e depoimentos das três autoras, conta ainda com as participações de Ana Luísa Amaral, Gilda Grillo e Adelino Gomes.

A obra "Novas Cartas Portuguesas" foi escrita em 1971 por Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, e nela as autoras denunciavam a guerra colonial, as opressões a que as mulheres eram sujeitas, um sistema judicial persecutório, a emigração e a violência fascista.

O livro, que se assumiu como um libelo contra a ideologia vigente na ditadura, no período pré-25 de Abril, foi publicado em abril de 1972 e banido três dias depois pelas forças desse regime, por “conteúdo insanavelmente pornográfico e atentatório da moral pública”.

Por causa desta obra, as autoras, designadas popularmente como "Três Marias", chegaram a ir a julgamento, que teve início a 25 de outubro de 1973, e só não foram condenadas porque, após sucessivos incidentes e adiamentos, se deu a Revolução de 25 de Abril de 1974.

O impacto internacional da obra deu-se logo pouco depois da sua divulgação pela escritora Simone de Beauvoir e pelo conhecimento público do processo de que estavam a ser alvo, com a cobertura do julgamento feita por meios de comunicação internacionais, manifestações feministas em frente a várias embaixadas de Portugal no estrangeiro e a defesa pública da obra e das autoras por várias personalidades internacionais, como Marguerite Duras, Doris Lessing, Iris Murdoch e Delphine Seyrig.

Estas ações fizeram com que o caso fosse votado, em junho de 1973, numa conferência da National Organization for Women, em Boston (EUA), como a primeira causa feminista internacional.

O documentário "O que podem as palavras", dedicado à obra e às três autoras, terá estreia no DocLisboa na secção "Heart Beat".

Neste mesmo programa, o festival anunciou outros quatro filmes: "DIO: Dreamers Never Die", sobre o músico Ronnie James Dio, "Dreaming Walls", sobre o mítico Hotel Chelsea, em Nova Iorque, "Still Working 9 to 5", dedicado ao filme de 1980 protagonizado por Jane Fonda, Dolly Parton e Lily Tomlin, sobre a novela de Patricia Resnick, com realização de Colin Higgins, e "Dancing Pina", sobre o trabalho de duas companhias de dança em torno da obra da coreógrafa Pina Bausch.

O DocLisboa revelou ainda alguns dos filmes da programação "Da Terra à Lua", entre os quais "Everything will be ok", de Rithy Panh, sobre democracia e totalitarismo, feito apenas com recursos a pequenas figuras e bonecos, e que foi premiado este ano em Berlim.

O realizador cambodjano Rithy Panh estará em Lisboa a convite do DocLisboa.

Em Lisboa estarão também a realizadora brasileira Maria Augusta Ramos, com o filme "Amigo Secreto", que segue o caso de investigação jornalística 'Vaza Jato', e o antropólogo franco-brasileiro Vincent Carelli, a propósito do filme "Adeus, Capitão", correalizado com Tatiana Almeida, sobre Krohokrenhum, um líder indígena do povo Gavião, do estado brasileiro do Pará.

A estes filmes, na secção "Da Terra à Lua" juntar-se-ão ainda "The Fire Within: Requiem for Katia and Maurice Krafft", documentário de Werner Herzog dedicado a um casal de vulcanologistas franceses, e "To the End", de Rachel Lears, sobre quatro ativistas ambientais e a proposta do 'Green New Deal' sobre alterações climáticas nos Estados Unidos.

O DocLisboa decorrerá de 6 a 16 e outubro no Cinema Ideal, Cinema São Jorge, Culturgest e Cinemateca Portuguesa / Museu do Cinema.