Sem a presença de títulos portugueses nas principais secções, foi conhecida hoje a aguardada seleção oficial para a 74ª edição do Festival de Cannes, apresentada pelo diretor artístico Thierry Frémaux e pelo Presidente do festival Pierre Lescure.
Após a anulação da edição de 2020 pela pandemia, o festival será celebrado este ano de 6 a 17 de julho na turística cidade do sudoeste da França após a suspensão da maioria das restrições sanitárias.
Alguns títulos já tinham sido anunciados para a competição pela Palma de Ouro, nomeadamente "The French Dispatch", de Wes Anderson (EUA), "Benedetta", de Paul Verhoeven (Holanda), e "Annette", de Leos Carax (França), protagonizado por Adam Driver e Marion Cotillard, que abrirá o festival.
Com 24 filmes, mais quatro do que o habitual, a seleção competitiva inclui títulos inicialmente previstos para o ano passado e cujos produtores preferiram aguardar pelo regresso do festival.
Na conferência de imprensa desta quinta-feira surgem vários realizadores já consagrados ou veteranos de Cannes, como o italiano Nanni Moretti ("Tre Piani"), o iraniano Asghar Farhadi ("A Hero"), o tailandês Apichatpong Weerasethakul ("Memoria"), os norte-americanos Sean Penn ("Flag Day") e Sean Baker ("Red Rocket"), o belga Joachim Lafosse ("Les Intranquilles"), o dinamarquês Joachim Trier ("The Worst Person in the World"), a húngara Ildikó Enyedi ("The Story of My Wife), o finlandês Juho Kuosmanen ("Compartment No. 6"), o japonês Ryusuke Hamaguchi ("Drive My Car") e o australiano Justin Kurzel ("Nitram").
O contingente francês tem como representantes os novos trabalhos de Jacques Audiard ("Les Olympiades"), François Ozon ("Tout S’est Bien Passé"), Bruno Dumont ("Par un demi clair matin"), Mia Hansen-Løve ("Bergman Island"), Julia Ducournau ("Titane"), Catherine Corsini ("La fracture") e Nabil Ayouch ("Haut et fort"), além do chadiano radicado na França Mahamat Saleh Haroun ("Lingui").
Outro realizador de referência na competição é o israelita Nadav Lapid ("Ahed's Knee"), também um veterano de Cannes, mas que ganhou o Urso de Ouro do Festival de Berlim com "Sinónimos", o seu último filme (2019), e o prémio especial do Júri do Festival de Locarno com "O Polícia" (2011).
Quem também regressa à competição com "Petrov’s Flu" é Kirill Serebrennikov, cuja presença física não está garantida e não é por causa da pandemia, mas por temer ser impedido de regressar ao seu país: figura de vanguarda do meio artístico da Rússia, esteve em prisão domiciliária entre agosto de 2017 e abril de 2019 e foi considerado culpado de fraude por um tribunal de Moscovo num caso controverso, o que é visto pelos partidários como o preço pela sua liberdade de criação e obras frequentemente ousadas, que misturam política, sexualidade e religião, quando as autoridades promovem os valores tradicionais e conservadores.
Não foi anunciada a competição do júri que decidirá a Palma de Ouro e os prémios principais, que será presidido pelo realizador norte-americano Spike Lee, que deveria ter ocupado essa função no ano passado.
Netflix volta a ficar de fora
Como é habitual, outros filmes deverão ser anunciados nas próximas semanas, mas não se espere que sejam da Netflix.
Em maio, em entrevista à revista Variety, Thierry Frémaux já sublinhara que os filmes a integrar a competição oficial teriam de ser estreados em sala em França: "A nossa regra é que a Palma de Ouro e os filmes da competição sejam descobertos por todos os públicos".
Esta quinta-feira, confirmou-se a ausência completa da plataforma entre os 64 títulos da seleção oficial, com Frémaux a destacar explicitamente que esta se mostrou intransigente tanto em não respeitar as regras do festival sobre a estreia nos cinemas franceses para concorrer à Palma, como nas negociações para outras secções, que envolveram dois potenciais filmes.
Os principais responsáveis por Cannes indicaram ainda o regresso da segunda secção mais relevante, "Un certain regard", às intenções originais do antigo diretor artístico Gilles Jacob, com a apresentação de títulos de "cinema de autor", com outras perspetivas, estilos e histórias invulgares, além de realizadores que se estreiam nas longas-metragens, ao contrário do que acontecia nos anos mais recentes, em que era visto como um "prémio de consolação" para filmes que não fora possível incluir na competição pela Palma de Ouro.
A seleção de 2021 junta "Money Boys" (C.B Yi, Áustria), "Blue Bayou" (Justin Chon, EUA), "Freda" (Gessica Généus, Haiti), "Delo" (Alexey German Jr., Rússia), "Bonne mère" (Hafsia Herzi, França), "Noche de Fuego" (Tatiana Huezo, México), "Lamb" (Valdimar Johansson, Islândia), "Commitment Hasan" (Hasan Semih Kaplanoglu, Turquia), "After Yang" (Koganada, EUA), "Et il y eut un matin" (Eran Kolirin, Israel), "Unclenching the fists" (Kira Kovalenko, Rússia), "Women Do Cry" (Mina Mileva e Vesela Kazavoka, Bulgária), "Rehana Maryam Noor" (Abdullah Mohammad Saad, Bangladeche), "Great Freedom" (Sebastian Meise, Áustria), "La Civil" (Teodora Ana Mihai, Roménia), "Gaey Wa'r" (Na Jiazuo, China), "The Innocents" (Eskil Vogt, Noruega) e "Un Monde" (Laura Wendel, Bélgica).
Ainda na seleção oficial, entre os títulos que serão apresentados na secção "Fora de competição" estão "Stillwater" (um "thriller" de Tom McCarthy rodado em Marselha com Matt Damon e Camille Cottin, EUA), "The Velvet Underground" (Todd Haynes, EUA), "De Son Vivant" (Emmanuelle Bercot, França), que se tornou mediático quando as filmagens foram interrompidas após o internamento de Catherine Deneuve por sofrer um acidente vascular cerebral, "Bac Nord" (Cédric Jiminez, França); "Aline" (Valérie Lemercier, França); e "Emergency Declaration" (Han Jae-Rim, Coreia do Sul).
Para a nova secção "Cannes Premiere", uma seleção que abrirá espaço para cineastas "confirmados" que já tenham sido selecionados para a competição, foram anunciados "Evolution" (Kornel Mundruczo, Hungria), "Cow" (Andrea Arnold, Grã-Bretanha), "Mothering Sunday" (Eva Husson, França), "Cette Musique Ne Joue Pour Personna" (Samuel Benchetrit, França), "In Front Of Your Face" (Hong Sang-soo, Coreia do Sul), "Serre-moi Fort" (Mathieu Amalric, França), "Tromperie" (Arnaud Désplechin, França), "Jane Par Charlotte" (Charlotte Gainsbourg, França), "Val" (Ting Poo, EUA) e "JFK Revisited: Through the Looking Glass" (Oliver Stone, EUA).
Na secção "Special Creenings" surgem "O Marinheiro das Montanas" (Karim Ainouz, Brasil), "Cahiers Noirs" (Shlomi Elbabetz, Israel), "Babi Yar. Contexte" (Sergei Loznitsa, Ucrânia), "H6" (Yé Yé, França) e "The Year of the Everlasting Storm" (uma antologia coletiva que junta Jafar Panahi, Anthony Chen, Malik Vitthal, Laura Poitras, Dominga Sotomayor, David Lowery e Apichatpong Weerasethakul).
A "Sessão da meia-Noite" será com "Oranges Sanguines", de Jean-Christophe Meurisse (França).
Thierry Frémaux e Pierre Lescure já conhecem o filme que encerrará o festival mas querem mantê-lo em segredo, prometendo um anúncio para mais tarde.
Outra novidade: a criação de uma secção temporária dedicada às questões ambientais (o Festival anunciou em meados de abril uma série de medidas destinadas a reduzir a sua pegada ambiental, bem como uma contribuição paga pelos jornalistas credenciados, hoje anunciada de 25 euros).
Dos programas paralelos, já fora anunciado que Jodie Foster e o realizador norte-americano Frederick Wiseman vão receber prémios de carreira da Quinzena de Realizadores.
Logisticamente, Thierry Frémaux, apelou à "prevenção" e "cautela", argumentando que a epidemia da COVID-19 ainda não foi "derrotada".
Tendo em conta esse cenário, há vários ajustamentos, nomeadamente mais sessões ao ar livre, incluindo uma na praia com o filme ainda por revelar de um grande estúdio de Hollywood, mas que "não é James Bond ['007: Sem Tempo Para Morrer'], não é Spielberg ['West Side Story'] e não é [a nova versão] 'Dune'".
Por ser um evento para mais de mil pessoas, o acesso ao festival será permitido apenas a quem esteja vacinado, ou apresente um teste negativo à COVID-19 ou tenha imunidade comprovada.
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