A caminho dos
Óscares 2025
A lista de nomeados para a 97.ª edição dos Óscares foi conhecida esta quinta-feira, ao início da tarde em Portugal continental, com poucas, mas agradáveis surpresas.
O filme brasileiro "Ainda Estou Aqui", de Walter Salles, que aborda o impacto da ditadura militar numa família nos anos 1970, superou as melhores previsões e faz história: além das nomeações para Melhor Filme Internacional e Melhor Atriz para Fernanda Torres, conseguiu uma presença na corrida para Melhor Filme, ao lado de "Emília Pérez", que se tornou o favorito às estatuetas douradas.
Em 1998, "Central do Brasil", também de Walter Salles, conseguira a última das quatro nomeações anteriores para o país em Melhor Filme Internacional, além da presença de Fernanda Montenegro, mãe de Fernanda Torres, para Melhor Atriz (e dá-se a simetria cinematográfica de as duas atrizes interpretarem em "Ainda Estou Aqui" a mesma personagem Eunice Paiva em diferentes fases da vida).
Ainda que com menos uma nomeação, "Ainda Estou Aqui" supera qualitativamente o impacto nos Óscares de "Cidade de Deus", de Fernando Meirelles, nomeado na cerimónia de 2004 para Melhor Realização, Argumento Adaptado, Montagem e Fotografia.
Já a curta de animação portuguesa "Percebes", de Alexandra Ramires e Laura Gonçalves, premiada no Festival de Cinema de Annecy, não conseguiu chegar à nomeação, ao contrário do que aconteceu há dois anos com "Ice Merchants" na mesma categoria.
As escolhas dos 9905 membros da Academia com direito a voto colocaram "Emília Pérez" como o favorito e potencialmente a primeira grande vitória da Netflix, que comprou no Festival de Cannes a mistura de 'thriller' e musical para distribuição nos EUA.
Com um rasto de prémios, conquistados, por exemplo, no Festival de Cannes, nos Prémios do Cinema Europeu e nos Globos de Ouro, foram 13 nomeações para a produção francesa falada em castelhano do realizador Jacques Audiard sobre um traficante mexicano que faz a transição para viver como mulher, batendo o recorde para o filme em língua não inglesa mais nomeado de sempre, que pertencia às dez nomeações de "O Tigre e o Dragão", de 2000.
Além de liderar as nomeações, o favoritismo reforça-se por ter conseguido concretizar tudo o que se esperava: a lista inclui Melhor Filme, Filme Internacional, Realização, Atriz (nomeação histórica para a atriz transgénero Karla Sofía Gascón), Atriz Secundária (Zoe Saldaña), Argumento Adaptado e várias categorias técnicas, incluindo duas canções. Nota-se apenas a ausência de Selena Gomez para Atriz Secundária, que sempre foi vista como uma hipótese mais distante por causa da competitividade na categoria.
Das nomeações anunciadas esperavam-se pistas sobre os filmes favoritos dos votantes da Academia pois nenhum se destacou claramente na temporada de prémios, como aconteceu no ano passado com "Oppenheimer".
Apesar do favoritismo para "Emília Pérez", quase todos os concorrentes diretos, muitos revelados também por Cannes ou pelo Festival de Veneza, conseguiram as nomeações esperadas e mantêm intactas as esperanças para a cerimónia no Dolby Theatre, a 2 de março, com apresentação de Conan O'Brien.
É o caso de "O Brutalista", o épico histórico de Brady Corbet que examina a experiência como emigrante nos EUA de um sobrevivente do Holocausto, que chegou às dez nomeações nas principais categorias e é o único a colocar três atores na corrida: Adrien Brody para Melhor Ator (22 anos após a vitória com "O Pianista"), e Guy Pearce e Felicity Jones como secundários.
Também houve dez nomeações para "Wicked", incluindo para Cynthia Erivo e Ariana Grande, embora a adaptação do popular musical da Broadway seja prejudicada por surpreendentemente ficar de fora na corrida para Melhor Argumento Adaptado e, como já se esperava, por Jon M. Chu falhar Melhor Realização.
Também Edward Berger ficou de fora da categoria de Melhor Realização por "Conclave", que ainda assim recebeu oito importantes nomeações, incluindo para os atores Ralph Fiennes e Isabella Rossellini, a estreia nas nomeações da lendária filha da atriz Ingrid Bergman e do realizador Roberto Rossellini.
"A Complete Unknown", o 'biopic' sobre os primeiros anos da carreira de Bob Dylan, também recebeu oito nomeações, e superou as previsões mais consensuais, com James Mangold a entrar em Melhor Realização e Monica Barbaro em Atriz Secundária.
Todos estão nomeados para Melhor Filme juntamente com "Anora", vencedor da Palma de Ouro de Cannes, que recebeu as esperadas seis nomeações, incluindo a dos atores Mikey Madison e Yura Borisov, mais uma do Dune - Duna: Parte 2" e "A Substância", este o único nomeado para Melhor Filme dirigido por uma mulher, Coralie Fargeat, que entrou também na sua categoria.
A categoria de Melhor Filme fecha com "Ainda Estou Aqui" e "Nickel Boys" (que só tem outra nomeação, pelo Argumento Adaptado), deitando por terra as esperanças de títulos como "Sing Sing", “O Atentado de 5 de Setembro” ou “A Verdadeira Dor". Para a sequela de "Gladiador", Óscar de Melhor Filme de 2000, uma única nomeação: Melhor Guarda-Roupa. E "Challengers" ficou sem nada.
Embora sejam categorias técnicas, "Nosferatu" surpreendeu com quatro nomeações, mais uma do que "Sing Sing" e "Robot Selvagem".
Houve duas importantes nomeações para os atores de "The Apprentice", e a mesma quantidade para "A Verdadeira Dor" e a animação da Letónia "Flow - À Deriva".
Com uma nomeação apenas ficaram ainda "Maria", "O Atentado de 5 de Setembro", "Divertida-Mente 2" e "A Different Man".
Os nomeados foram apresentados pelos atores Bowen Yang ("Wicked") e Rachel Sennott ("Corpos, Corpos, Corpos"), mas primeiro a presidente da Academia Janet Yang e o presidente executivo Bill Kramer fizeram referência ao impacto na comunidade dos incêndios que atingem Los Angeles desde 7 de janeiro, que levaram duas vezes ao adiamento das nomeações.
Categorias dos atores não tinham mesmo vagas para todos
Apesar de alguma ausências, as nomeações nas quatro categorias de interpretação confirmaram os consensos formados após a cerimónia dos Globos de Ouro a 5 de janeiro, a única com transmissão televisiva dois dias antes do início dos incêndios em Los Angeles. O prolongamento das votações durante mais cinco dias deu aos votantes a oportunidade de verem vários dos filmes e atores premiados.
Na competição fratricida para Melhor Atriz, Demi Moore ("A Substância") juntou-se a Fernanda Torres ("Ainda Estou Aqui"), Karla Sofía Gascón ("Emília Pérez"), Mikey Madison ("Anora") e Cynthia Erivo ("Wicked"), com as quatro primeiras a serem estreantes nas estatuetas douradas.
Pelo caminho ficaram as esperanças de Pamela Anderson (“The Last Showgirl”), Angelina Jolie (“Maria”), Nicole Kidman (“Babygirl”), Tilda Swinton (“O Quarto ao Lado"), Kate Winslet (“Lee Miller: Na Linha da Frente”) ou Marianne Jean-Baptiste ("Hard Truths", de Mike Leigh).
Para Melhor Ator, confirmou-se o consenso dos últimos dias: Sebastian Stan (“The Apprentice - A História de Trump”) estreia-se nos Óscares e acompanha o antigo vencedor Adrien Brody ("O Brutalista") e os anteriormente nomeados Ralph Fiennes ("Conclave"), Timothée Chalamet (“A Complete Unknown”) e Colman Domingo (“Sing Sing”), este último o único repetente dos 20 nomeados do ano passado.
Ficaram de fora Daniel Craig (“Queer”), Hugh Grant ("Herege") e Jesse Eisenberg ("A Verdadeira Dor").
Para Melhor Ator Secundário, Jeremy Strong ("The Apprentice") juntou-se ao colega da série "Succession" Kieran Culkin ("A Verdadeira Dor") e Yura Borisov ("Anora"), Edward Norton ("A Complete Unknown") e Guy Pearce ("O Brutalista"), não sobrando vagas para entrarem Clarence Maclin ("Sing Sing"), Denzel Washington ("Gladiador II") ou Jonathan Bailey ("Wicked"). Neste grupo, apenas Edward Norton já tinha sido nomeado antes para os Óscares.
Na muito competitiva corrida para Melhor Atriz Secundária, onde se espera uma grande disputa entre Zoe Saldaña ("Emília Pérez") e Ariana Grande ("Wicked"), os outros três lugares foram para Isabella Rossellini ("Conclave"), Monica Barbaro ("A Complete Unknown") e Felicity Jones ("O Brutalista"), esta última a única que já tinha sido nomeada antes, há dez anos por "A Teoria de Tudo".
Não se confirmaram as apostas em Jamie Lee Curtis ("The Last Showgirl"), Margaret Qualley ("A Substância"), Danielle Deadwyler ("A Lição de Piano") ou Aunjanue Ellis-Taylor ("Nickel Boys").
Melhor Realização: uma mulher entre homens
Significativamente, muitas campanhas para os Óscares já passam não só por Los Angeles e Nova Iorque, mas também por Londres e Copenhaga: a Academia, que impulsiona uma campanha por uma representação mais global, tem um núcleo internacional cada vez mais influente (20% dos votantes) e responsável por nomeações surpreendentes.
Muito dessa representatividade tem-se traduzido pela maior renovação nas nomeações para Melhor Realização e este ano não foi exceção, com todos a serem estreantes na categoria.
E um ano depois da francesa Justine Triet por "Anatomia de Uma Queda", a compatriota Coralie Fargeat torna-se a nona mulher cineasta na corrida em 97 anos com "A Substância".
Os outros nomeados correspondem aos do influente Sindicato dos Realizadores: Jacques Audiard ("Emília Pérez"), Sean Baker ("Anora"), Brady Corbet ("O Brutalista") e James Mangold ("A Complete Unknown").
Não conseguiram chegar ao lote de finalistas os já referidos Edward Berger ("Conclave") e Jon M. Chu ("Wicked"), mas também RaMell Ross ("Nickel Boys") e principalmente Denis Villeneuve ("Dune - Duna: Parte Dois"), tal como aconteceu com Peter Jackson, esquecido em 2002 por "O Senhor dos Anéis: As Duas Torres" antes de ser consagrado no ano a seguir com os 11 Óscares para o fim da saga, "O Regresso do Rei".
Filmes internacionais e animações
Além de "Emília Pérez" (França) e "Ainda Estou Aqui" (Brasil), vão concorrer para o Óscar de Melhor Filme Internacional "A Semente do Figo Sagrado", do iraniano Mohammad Rasoulof (Alemanha), "A Rapariga da Agulha", de Magnus von Horn (Dinamarca) e "Flow – À Deriva", de Gints Zilbalodis (Letónia), confirmando a popularidade do filme de animação.
"Flow" surge na corrida para Melhor Longa-Metragem de Animação, juntamente com os também esperados "Divertida-Mente 2", considerado um regresso da Pixar às boas graças dos críticos e dos espectadores (com quase 1,7 mil milhões de dólares nas bilheteiras mundiais, trata-se do maior sucesso comercial de 2024), "Robot Selvagem", que conseguiu os mesmos elogios para a DreamWorks Animation, e duas animações stop-motion, a australiana "Memórias de um Caracol" e a mais recente maravilha do estúdio Aardman que é "Wallace & Gromit: A Vingança das Aves", cuja longa-metragem anterior da saga, "Wallace & Gromit: A Maldição do Coelhomem" (2005), foi a primeira do género a ganhar este Óscar.
Noutras nomeações, destaque para a presença de “No Other Land”, filme coletivo feito por ativistas israelitas e palestinianos, sobre a ocupação de Israel de territórios palestinianos, para o Óscar de Melhor Documentário em Longa-Metragem.
Veja a lista completa de nomeações aqui.
REVEJA O ANÚNCIO ABAIXO (e siga ao minuto este artigo que estará em permanente atualização com a lista de todos os nomeados):
Comentários