Foi na década de 70 que Ilda começou a trabalhar com a fadista, de quem se tornou amiga.

Ilda Aleixo comemorou recentemente, em 06 de março, os 100 anos, numa festa reservada no lar onde se encontrava, em virtude dos cuidados a ter no âmbito da pandemia de covid-19.

“Vou dizer aquilo que sei de mim própria”, dizia Ilda Aleixo, costureira de profissão, há alguns meses, quando entrevistada para a agência Lusa, no âmbito de um trabalho sobre como os centenários viam a covid-19 em Portugal.

Com 100 anos, era natural que se queixasse da memória e Ilda tinha consciência disso mesmo: “Antigamente não me esquecia de nada, mas agora até me esqueço do que aconteceu ontem”, dizia.

Mesmo assim, continuava a recordar-se do seu passado mais distante, nomeadamente dos tempos de casada.

“Foi um casamento que não teve muito resultado, mas até o meu marido morrer tratei muito dele”, contou.

De entre as memórias que não se apagaram com o tempo estão os momentos que partilhou com a fadista. Lembrava-se do dia em que Amália Rodrigues a convidou para ir viver consigo:

“Ela perguntou-me: ‘não era melhor vir cá para casa?’ Fui e lá fazia a roupa dela”, acrescentou.

Ao longo da carreira artística de Amália, Ilda Aleixo idealizou, desenhou e costurou muitos vestidos, fossem eles para serem exibidos numa ocasião especial ou num espetáculo em palco, quer fossem para simples uso no dia-a-dia.

Ilda ainda se lembrava de um vestido que fez. Na conversa com a Lusa lamentou que aquele que considerava ter sido o mais bonito que fez para Amália nunca tenha sido usado em público: “Amália até gostou muito do vestido, mas acabou por nunca ter saído com ele”.

Nesta entrevista, Ilda Aleixo recordou que a sua paixão pela moda começou quando era muito nova. “Em pequena, tinha a mania de fazer vestidos para as bonecas. Eu fazia e não fazia nada”, afirmava, sorrindo ao recordar-se destas memórias mais antigas.

Recordava também o momento em que conseguiu trabalho num ateliê de alta-costura, onde mais tarde chegou a ser mestre.

O segredo para chegar aos 100 anos atribuiu ao que comia.

“Sempre tive muito cuidado com aquilo que comia. Embora goste do cheiro do café, não bebo. Nem café, nem leite. Só bebo chá”, revelou.

Ilda Aleixo não tinha grandes sonhos. Sempre gostou de ler e de aprender. Preferência para romances que lhe chegavam vindos do Brasil. Lembrava-se de dois judeus que fugiram de Hitler para o Brasil: “Stefan Zweig”, um nome que lhe ficou sempre na memória, o famoso escritor austríaco, um dos mais vendidos do mundo, e que se suicidou no Brasil, onde vivia exilado, ainda antes do fim da Grande Guerra.

“Eu sempre gostei muito de ler. Lia tudo e mais alguma coisa. Isso instruiu-me bastante. Li muito, mesmo muito, e isso fez-me muito bem”, afirmava Ilda Aleixo.

Quando questionada, nesta entrevista à agência Lusa, sobre o que ainda esperava da vida, a costureira foi muito lúcida: “Um dia vou ficar ‘tan-tan’ e pronto, acabou-se. O que eu acho é que daqui a alguns anos ficarei sem saber o que é existir e pronto, acabou”.

Ilda da Graça dos Santos Aleixo entrou na Sant´Ana Residência Sénior em 8 de fevereiro de 2018.

Em abril deste ano caiu durante a noite e partiu o colo do fémur.

Foi operada no hospital de Coimbra, mas acabou por ser transferida para o Hospital dos Covões para convalescença. Aí o seu estado clínico agravou-se.

Em maio regressou à residência sénior, mas nunca aceitou bem as limitações a que ficou sujeita pelo facto de ficar acamada e em total dependência.

Morreu na manhã de terça-feira com uma insuficiência cardíaca.

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