20h00 – A noite começou, no BES Arte & Finança, com sotaque brasileiro, nas vozes de Cícero, Momo e Wado, que formam o projeto Brasil D’Agora. Em conjunto ou a solo, o trio de músicos foi subindo ao palco para apresentar músicas de cada um destes cantores ou feitas em parceria. A sala pequena, mas acolhedora para este projeto especial, encheu-se do calorzinho do som brasileiro e da camaradagem entre os músicos e público, numa noite lisboeta bem fria.

A abrir, Wado (que vai no seu oitavo trabalho, “Samba 808”, disponível para download gratuito em www.wado.com.br), canta um dos temas feito em parceria, “Rosa”, com a ajuda de Cícero. Depois é a vez daquele que mais fãs tinha entre o público, Cícero, cantar um dos temas do seu álbum “Canções de Apartamento”, “Tempo de Pipa”, para dar, por sua vez, a passagem a MoMo, o terceiro elemento deste grupo de músicos que faz música em casa, entre amigos, que trabalha sem empresários e que disponibiliza todos os seus trabalhos gratuitamente através de Internet.

Momo acompanha Cícero, e cantam “Duas Quadras”, um tema do segundo álbum de Cícero, “Sábado”. Wado sobe ao palco para cantar “Flores do Bem” com Momo, não sem antes agradecer aos amigos presentes. A dança entre músicos continua com Wado e Cícero a interpretarem “Com a Ponta dos Dedos”, do mais recente disco de Wado, onde ele canta com Mallu Magalhães e Marcelo Camelo. Cícero agradece ainda a Marcelo Camelo, um dos mentores deste projeto, e relembra que todos os trabalhos do músico estão disponíveis na Internet (www.cicero.net.br e www.momomusica.com).

A festa continua com Cícero a entoar “Açúcar ou Adoçante”, do seu primeiro disco, “Canções de Apartamento”. Seguem-se mais alguns temas feitos em parceria, para a festa fechar com um tema de Cícero, do seu primeiro álbum. Todos cantam “Laiá Laiá”, numa onda festiva que havia de deixar bem mais quente quem ali se encontrava.

20h40 - A Casa do Alentejo é verdadeiramente deslumbrante. A decoração deste antigo palacete é capaz de nos deixar a contemplar os seus pormenores arquitetónicos durante horas, desde o traço árabe do saguão, logo à entrada, até aos belíssimos arcos, os mosaicos e a decoração da sala Dr. Víctor Santos, local escolhido para a atuação dos Ciclo Preparatório. E que melhor espaço para acolher o grupo coral pop especial rural-chique delicodoce (segundo palavras dos próprios) que tem vindo a expressar a sua música de norte a sul do país?

Um aviso, colado na entrada do espaço, não deixava margem para dúvidas: a sessão estava esgotada. Dentro das quatro paredes, os Ciclo Preparatório apresentaram, com toda a calma e vagar do mundo, canções do seu álbum de estreia, “As Viúvas Não Temem a Morte”, e deliciaram os presentes com canções como “A Volta ao Mundo com a Lena d’Água “, “Por Quem Não Esqueci” (versão do original dos Sétima Legião, timidamente cantada pelo público) e “Tradição”.

20h45 – Ver Gisela ao vivo é uma experiência única. A fadista trouxe com ela o seu álbum de estreia, considerado pela revista Blitz o Melhor Álbum de Música Portuguesa de 2013, e aquela alma cheia de vida e energia, que faz com que cada fado saído da sua boca seja uma emoção. Vestida de branco e usando ténis pretos, Gisela conseguiu encher a Sociedade de Geografia de Lisboa de público e de calor. Cantou, como só ela sabe, temas como “Bailarico Saloio”, “Voltaste”, “Primavera Triste”, “Malhões e Vira”, “A Casa da Mariquinhas”, numa nova adaptação com letra de Capicua, a quem Gisela agradeceu, “uma vez que eu não sei escrever canções”. O público, que não parou de entrar ao longo do concerto, respeitou a máxima fadista “silêncio, que se vai cantar o fado” e deixou-se levar pelas ruas de Lisboa, guiado pela voz de Gisela João.

21h18 - Em química há uma sigla - já longe do alcance da memória - e um conjunto de cálculos que nos ajudam a saber se estamos perante as condições de temperatura e pressão ideais para a realização de uma reação. E na música? Será que há forma de calcularmos quais as melhores condições, ou melhor dizendo, as condições ideais, para a realização de um concerto? A verdade é que o espetáculo dos Tape Junk terá andado muito próximo desses valores. Poucas pessoas, o que é sinónimo de pouca confusão (quando a banda de João Correia deu início às hostes, ao som de “Only Son”, estariam na sala cerca de uma vintena de pessoas, um número que aumentou consideravelmente ao longo do concerto), uma mistura razoável de som, com todos os instrumentos a chegarem-nos aos ouvidos de forma equilibrada, e um quinteto com a garra necessária.

O concerto na Sala Montepio do cinema São Jorge orbitou em torno de “The Good and The Mean”, álbum lançado através da Optimus Discos, onde podemos encontrar evidenciada toda a ligação que João Correia tem com a música norte-americana, como o próprio referiu recentemente numa entrevista ao Palco Principal: “Com um imaginário muito western e outlaw country”. E, de facto, a primeira imagem que nos surge quando ouvimos o tema “The Good and The Mean” é a da capa de um filme de Sergio Leone: locomotivas a vapor a atravessarem desertos áridos, tipos a cavalo a ordenarem os seus ranchos, saloons, cerveja, etc. Basicamente, todo o retrato de uma América que só nos soa bem ao ouvido. E que ainda soa melhor pelas mãos de João Correia. “Buzz”, “Me & My Gin” e “Tombstone” foram alguns dos temas ouvidos.

21h30 – O Coliseu dos Recreios recebeu os Daughter, pela primeira vez no nosso país, e visivelmente emocionados com a calorosa recepção do público. “Thank you so much”, foi a frase que mais se ouviu da boca de Elena Tonra e do guitarrista Igor Haefeli. A timidez da vocalista talvez não tenha sido a melhor companheira da banda, uma vez que impediu que esta brilhasse em palco tanto como consegue fazê-lo nos trabalhos de estúdio. Talvez, por isso, a prestação dos Daughters tenha ficado aquém das expetativas.

Depois de terem aberto com “Still”, do álbum “If You Live”, os Daughter foram saltando entre os seus dois EPs, “His Young Heart” e “The Wild Youth”, o single “Smother” e o já referido, e único álbum, “If You Leave”. Pelo palco foram desfilando canções como “Love” - com Igor a anunciar que este era o último concerto do ano e que era bom estarem em Lisboa -, “Candles” - um dos seus temas mais conhecidos e mais reconhecidos pelo público -, “Human” e “Smother”.

Com o tema “Youth”, houve ainda tempo para um dos clássicos dos concertos: os isqueiros que se acenderam e o público que cantou em uníssono: “We are the reckless/ We are the wild youth/ Chasing visions of our futures/ One day we'll reveal the truth/ That one will die before he gets there".

“This is our last song. We would like to comeback to this beautiful city. This is specially for you, guys. Have a lovely evening”, afirmou Igor Haefeli, antes de os Daughter se despedirem com “Love”.

22h11 - Junto ao Marquês de Pombal, no espaço BES Arte & Finança, os Octa Push fizeram o crossover perfeito entre a orgânica e a eletrónica - de facto, se na sexta-feira reinaram as guitarras e as distorções de bandas como as Savages e Wavves (ainda estamos a recuperar da experiência negativa com estes últimos), a noite de ontem revelou-se intensa nos campos da música de dança. Acompanhados na voz por Braima Galissá (com o seu kora - instrumento de 22 cordas - deu vida a temas como “Ali Dom” e “Tamu”) e Catarina Moreno (interpretou canções como “Green Grass” - cover de Tom Waits - e “Please, Please, Please”), os irmãos viajaram entre Portugal, Inglaterra e África e misturaram a pulsação humana (com o auxílio de Ary, dos Blasted Mechanism) com os circuitos eletrónicos das máquinas, num cocktail que colocou as várias dezenas que subiram ao topo da Avenida da Liberdade a dançar. “Françoise”, “Would Be Mice" e “Glimpse” foram alguns dos pontos altos da atuação.

22h30 – Silva não foi agraciado pelas melhores condições na sua apresentação no Mexefest. Quase 15 minutos depois da hora prevista – o que, num festival, se pode revelar fatídico para um músico, uma vez que há sempre alternativas em vez de se ficar à espera –, o músico brasileiro abriu o concerto com o seu tema mais conhecido, “2012”, do seu álbum “Claridão”, de onde o músico retirou quase todas as canções que apresentou neste concerto. Mas o som, que nem sempre dava as suas boas graças, acabou por ser o inimigo número um de Silva. Primeiro foi uma coluna que estoirou, depois o músico que ficou um tempo sem som no microfone, ficando a cantar para “o boneco”. Acompanhado apenas por bateria, ainda assim o músico não desfez “a pose” e conseguiu um bom momento musical, embalando ou colocando o público a dançar como canções, como “Cansei”, “Posso” ou “Claridão”.

00h00 – Oh Land, que, como Silva, teve o azar de tocar no palco Vodafone na Estação do Rossio, foi também presenteada pelo azar do som, que não esteve nas melhores condições neste palco. Quase com 20 minutos de atraso, devido aos acertos de som no palco, a dinamarquesa conseguiu, todavia, apresentar um dos maiores concertos deste festival. Acompanhada de bateria, guitarra, teclas e uma voz no coro, a ex-bailarina – que começou a cantar depois de abandonar a carreira de dança, devido a uma lesão – tocou, cantou e dançou energeticamente. O público, que não parou de entrar no recinto até quase ao fim do espetáculo, fez a vontade a Nanna Øland Fabricious e não parou de dançar e cantar, principalmente quando entravam os tons dos temas mais conhecidos, como “Wolf and I” ou “Perfection”, ambos de “Oh Land” (2011). Mas foi, sobretudo, ao seu recente "Wish Bone" que foi buscar canções. No entanto, as condições não foram as melhores para a voz de Nanna que, apesar do seu tom doce, soou muitas vezes de forma estridente devido ao som demasiado alto do seu microfone.

00h18 - The Legendary Tiger Man subiu ao palco da sala Manoel de Oliveira como um dos grandes nomes do segundo dia do festival Vodafone Mexefest, e prova disso foi o facto do espaço ter enchido até ao limite da sua capacidade. Foram vários os que se deslocaram ao Cinema S. Jorge para ver ao vivo o autor do aclamado “Femina”, que viu a sua digressão chegar ao fim na noite de ontem.

Sem demoras, sensivelmente à hora marcada, uma das características positivas que tem pautado estes dois dias de festival, Paulo Furtado entrou em cena e atirou-se a “Do Come Home To Me”, primeira amostra de “True”, o tão aguardado álbum, com lançamento previsto para março de 2014. “Walkin’ Downtown” deu continuidade ao concerto, com Tiger Man a subir para o habitual estrado recheado de instrumentos (bombo, tarola e outros elementos de percussão), maquinaria e microfones com vários efeitos, seguindo-se de “Naked Blues”, canção estandarte do álbum de estreia deste “One Man Band”, que contou com a projeção da curta-metragem referente. Tal e qual como Woodkid, mas em escalas e vivências diferentes, Paulo Furtado também oscila entre a paixão pela música e a sétima arte. Por isso mesmo, horas antes do espetáculo, o músico acompanhou, no Cinema S.Jorge, a projeção de curtas da sua discografia com temas instrumentais.

Antes de se lançar a uma versão de “Twenty Flight Rock”, de Eddie Cochran, o músico pediu às primeiras filas da plateia para subirem para a linha dianteira de palco. “Já uma vez fiz isto e a brincadeira saiu-me cara, fiquei uns quantos meses a pagar os prejuízos. Espero que desta vez não haja problemas”, confessou. O público respondeu ao apelo e juntou-se a Paulo Furtado em palco, mas não por muito tempo. Alguns minutos depois, alguns elementos da organização pediram às pessoas que se voltassem a sentar comodamente nos seus lugares. Provavelmente por estarem a tapar a visibilidade de outros.

Tempo para as participações especiais da noite. Rita Redshoes foi a primeira. Chamada ao palco para interpretar mais um tema do álbum novo, a cantora deu voz, em conjunto com o anfitrião, a “I’m On The Run”, canção que será certamente um dos pontos altos de “True”. Seguiu-se o tema instrumental “Green Onions”, com a participação de Filipe Costa nas teclas, um verdadeiro génio no domínio do instrumento, a fazer-nos lembrar, muito devido aos tiques e, claro, à magnificência enquanto músico, o incansável Jerry Lee Lewis. Um momento que foi correspondido pelo público com os merecidos aplausos. Por fim, foi a vez de Paulo Segadães dar o seu contributo na bateria, para o tema “Gone”.

Até ao final do concerto houve uma injeção de energia com “Bad Luck Rhytm’ N’ Blues Machine” (nova paragem em “Masquerade”), um convite aos presentes para se levantarem e dançarem ao som de “She Said” (regresso a “Femina”), um passeio a bordo de “Big Black Boat” e uma incursão pelo meio do público com “21st Century Rock ’n’ Roll” (novamente acompanhado na bateria por Paulo Segadães).

Grande exibição de Paulo Furtado que, depois do soar da última nota do último tema, e depois de ter agradecido ao público com um simples “obrigado Lisboa”, abandonou a sala Manoel de Oliveira sem hipótese de um retorno para um encore. Muitos ficaram sentados na plateia na esperança de um regresso do músico de Coimbra, mas tal não aconteceu.

01h53 - Quando a equipa do Palco Principal chegou ao Coliseu dos Recreios, já o coletivo D.I.S.C.O.Texas se encontrava há horas a atuar. Numa curadoria que começou por volta das 23h00 e que se terá estendido até às 4 da manhã, os artistas Mr. Mitsuhirato, Mirror People, Da Chick, Moullinex e Xinobi fizeram as delícias daqueles que procuraram aquecer corpo e alma na arena contígua à Rua das Portas de Santo Antão.

No momento em que chegámos ao Coliseu dos Recreios (completamente cheio, das bancadas à plateia), Da Chick encerrava a sua prestação ao som de uma versão de “Sossego”, de Tim Maia. No palco era visível uma toalha de mesa aos quadrados vermelhos, vários abacaxis e outros elementos cénicos. Estava, de facto, montado o piquenique noturno de uma das editoras mais promissoras da música de dança.

Seguiu-se a atuação de Moullinex - acompanhado na bateria e guitarra - que, como é usual, evocou sonoridades do disco sound dos anos 70, com artistas como Donna Summer, KC and the Sunshine Band, The Jacksons, Chic e, mais recentemente, os Daft Punk de “Random Access Memories” como principais coordenadas. "Boa noite, isto é o picnic D.I.S.C.O.Texas e nós somos os Tony Carreira”, relembra Moullinex na sua entrada em palco, não fossemos nós confundir este evento com o famoso picnic da conhecida cadeia de hipermercados. A atuação seguiu com o músico a revisitar temas do álbum “Flora” e a ser correspondido da melhor forma pelos milhares espalhados pelo espaço.

E foi assim, com o Coliseu dos Recreios transformado numa gigantesca pista de dança revivalista (no intervalo entre Da Chick e Moullinex foi possível ouvir canções como “Maniac”, de Michael Sembello, e “Let’s Dance”, de David Bowie), que o Vodafone Mexefest chegou ao fim, com o remate final a ficar a cargo do DJ set de Xinobi.

Texto: Helena Ales Pereira e Manuel Rodrigues
Fotografia: Marta Ribeiro