"Obrigado. De nada", disse Ian Astbury várias vezes ao público ao longo do concerto dos Cult no Palco Paredes de Coura. E o concerto também se manteve no tom despachado do vocalista, com a banda a debitar hits - não por acaso, os temas mais recentes ficaram quase todos de fora - ao longo de hora e meia.

O grupo britânico, quase com 30 anos de carreira, voltou muitas vezes ao passado - e em especial aos anos 80, o seu período áureo - num concerto onde não faltaram convertidos. As honras de cabeças de cartaz assentaram bem aos Cult, que numa actuação enxuta terão dado o que os seus seguidores procuravam.

Vestidos de negro, e com Astbury a reforçar a carga sombria através de uns óculos escuros, não se esqueceram de tirar o pó a clássicos como "Rain" ou "Sweet Soul Sister". Mas o momento mais celebrado chegaria já perto do final, com "She Sells Sanctuary", muito provavelmente o tema mais popular do grupo e daqueles que marcou uma geração (por cá, foi a canção do genérico do programa televisivo "Portugal Radical", em inícios dos anos 90).

Antes do rock dos veteranos, o final de tarde fez-se com actuações enérgicas de bandas bem mais recentes. As nova-iorquinas Vivian Girls foram uma bela banda-sonora para um entardecer lânguido e, em modo mais acelerado e com mais testosterona, os Enter Shikari e os Gallows, ambos britânicos, disputaram a posição de maiores agitadores do dia.
Os segundos terão levado a taça para casa, mérito de um vocalista tagarela, Frank Carter, que vestiu bem a pele de animal de palco. Carter espicaçou o público entre quase todas as canções, fosse para pedir uma pirâmide humana - que acabou por se tornar num impressionante e poeirento mosh pit - ou para fazer dedicatórias várias - "às ovelhas negras, como eu e vocês", disse. E no meio de tanto empenho, mesmo quem não tenha achado especial graça ao punk hardcore do grupo terá esboçado uns sorrisos.

Menos explosivo, o concerto de Eli 'Paperboy' Reed propôs soul e funk e conquistou os primeiros movimentos dançáveis entre o público, não obstante o calor - que, tal como na quarta-feira, voltou a condimentar a tarde. E talvez para dançar mais à vontade, a banda do norte-americano apresentou-se em trajes muito veraneantes, envergando uns boxers e pouco mais.

Já umas horas mais tarde, no fecho do Palco Paredes de Coura, o calor acabaria por faltar à actuação de Caribou, projecto de Dan Snaith - pelo menos a julgar pelas várias desistências. "Swim", o novo álbum do canadiano, orientou um alinhamento um pouco irregular, ainda que as notórias diferenças das canções face às versões do disco mereçam ser saudadas.
Acompanhado por mais três músicos, Snaith deu assim mais corpo à sua música - rotulá-la como electrónica acaba por ser limitado quando no palco se tocou bateria, baixo, guitarra, teclados, pandeireta ou flauta.
Ao fundo, projecções de imagens com cores esbatidas reforçaram a carga onírica e/ou alucinogénia das composições, mas foi pena que a actuação tenha durado pouco.
Com menos de uma hora de duração, o concerto terminou logo após aquele que foi, de longe, o seu momento alto. "Sun", o novo single de Caribou, não só superou a versão editada como foi talvez a melhor coisa que se ouviu este ano no festival. O título da canção foi repetido até à exaustão e envolto por uma melodia circular e hipnótica, alvo de múltiplas variações de intensidade num estonteante oásis sonoro. Tudo o que viesse depois disso sairia a perder, mas ainda assim lamenta-se que não tenha havido mais nada.

Mais coesa, a actuação dos We Have Band resultou numa óptima estreia do trio britânico em Portugal. O Palco After-Hours foi o local certeiro para a apresentação do primeiro disco do grupo, o recente "WHB, e se muitas canções não deixaram de soar algo derivativas - como se nascessem de um encontro entre Juan Maclean e os Chromeo -, ainda conseguiram ser quase sempre cativantes. Temas como "Oh" ou "You Came Out" mostraram-se mesmo irresistíveis e, já nas primeiras horas da madrugada, mantiveram o sono longe dos que ouviram a sua electrónica dançável - e bem sucedida tanto nos episódios mais poppy como nos sinuosos.

Decididamente menos apropriados para o Palco After-Hours, os norte-americanos Best Coast não deixaram de assegurar um concerto simpático. Mas pouco mais, nem sempre correspondendo ao que se esperava de um cartão de visita tão apelativo como o seu álbum de estreia, "Crazy for You", uma boa mistura de heranças do surf pop e dos girl groups dos anos 60 (e que tem, por exemplo, os Spoon entre os fãs).
Esse tom luminoso (ainda que pontuado por alguma melancolia) sairia, aliás, beneficiado num horário diurno, com direito a Sol, em vez de num contexto que pede outros sabores musicais. Assim, entremeados entre o concerto ocasionalmente frenético dos We Have Band e set de DJ Coco, os temas dos Best Coast acabaram por perder algum fulgor, mesmo que não tenham sido despiciendos enquanto canções de embalar.

Nesta sexta-feira, a 18ª edição do Festival Paredes de Coura entra no terceiro dia com concertos dos Courteneers, Peter Hookou White Lies. Os Klaxons são os cabeças de cartaz.

Texto @Gonçalo Sá / Fotos @Alice Barcellos