Antes da música houve para Martinho outras profissões: foi auxiliar de química industrial (preparava Óleos, Graxas, Ceras, Perfumes e Sabões). “Não sei fazer nada disso”, confessa hoje o músico. Também no laboratório químico e farmacêutico do exército brasileiro, instituição na qual serviu como Sargento Burocrata. E ainda frequentou a Escola de Instrução Especializada, tornando-se escrevente e contador.

Tudo isto foi há mais de 45 anos, em finais da década de 1960, altura em que dedicou a totalidade do seu tempo à música. “Nesta década apareceram os festivais de música no Brasil e surgiram os grandes nomes da música, como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Maria Bethânia, entre outros”.

De que forma esta “década forte” influenciou o músico brasileiro? “Eu não sei falar muito sobre influências, porque não pensava em ser artista. Quem sonha com esta ambição tem alguém como um foco – se for ator vou ser como fulano e tal, se for cantor eu vou ser assim – e não tinha isso”, conta ao SAPO Música.

Na altura, Martinho da Vila fazia paródias, compunha músicas próprias, produzia alguns sambas para escolas de samba, mas o seu sonho era ter uma música sua gravada por um artista. “No fundo, acabei por ser eu a gravar e tive de arranjar a minha maneira de gravar e de cantar. Acabei por criar uma escola e uma outra vertente”, considera.

Quase meio século depois, revive e recria o seu primeiro disco, um homónimo que data de 1969. As músicas contidas neste seu primeiro trabalho discográfico foram atualizadas para figurarem em “4.5 Atual”, o nome do álbum que agora está a promover.

“A atualização das músicas é feita no campo da sonoridade, porque os discos do passado têm um som inferior. Os meus ouvidos hoje estão mais habituados a um som mais apurado. Apesar disso, há quem pense que [o “4.5 Atual”] é uma coisa nova”, detalha.

Olhando para a lista de temas incluídos no disco, como “Menina e Moça”, “O Pequeno Burguês” ou “Pra Que Dinheiro”, Martinho da Vila afiança que, se fosse hoje, talvez não os gravasse.

“Por exemplo, as rimas de ‘Menina e Moça’ são primárias, ou seja terminam em ‘a’ – menina e moça vem passear, menina e moça quer fretar, é tudo em ‘à’. Hoje ia por outros caminhos e rebuscava um pouco mais”, assegura.

Prossegue com o raciocínio, dizendo que hoje “é mais difícil conseguir fazer uma coisa mais simples, porque há mais informação e, como já se conhecem mais vocábulos e já se leram mais livros, utilizam-se palavras que antigamente não conhecia”.

E porquê “4.5 Atual”? Atual está relacionada com a regravação e atualização das músicas incluídas, já 4.5 tem uma história curiosa. “Lá no Rio de Janeiro, quando, por exemplo, uma mulher tem 19 anos e vai fazer 20, ela diz que vai fazer 2.0 (risos). 45 anos de carreira é uma coisa, 4.5 é mais suave”, conta.

O Ano do Brasil em Portugal

O calendário de comemorações do ano do Brasil em Portugal é extenso. A próxima decorre já este fim-de-semana. No domingo, 23 de setembro, no Terreiro do Paço, em Lisboa, vários músicos portugueses e brasileiros, como Martinho da Vila, Carminho, Zeca Baleiro, Boss AC, Zé Ricardo e Paulo Gonzo, vão cantar lado a lado.

Nesta reunião musical e da lusofonia, Martinho da Vila indica que a sua “melhor expetativa” está no encontro com a fadista Carminho.

“Conhecia-a ainda nova. Mais tarde começou a tocar numa casa de fados no Bairro Alto, em Lisboa, creio, e fui lá vê-la. Gostei muito e convidei-a para fazer uma música comigo, fizemos um espetáculo no Coliseu e ela hoje é uma estrela fantástica”, elogia.

A entrada para o concerto no Terreiro do Paço, em Lisboa, é gratuita.

@Daniel Pinto Lopes