A HISTÓRIA: Mundos colidem quando Barry Allen usa os seus super poderes para viajar no tempo por forma a alterar alguns eventos do passado. Quando a sua tentativa para salvar a sua família altera inadvertidamente o futuro, Barry fica preso numa realidade onde o General Zod regressou, ameaçando o mundo de aniquilação e onde não existem super-heróis para salvar a humanidade. Isto é, a menos que Barry consiga persuadir um Batman já reformado e muito diferente e salve um prisioneiro 'kryptoniano' que não é exatamente quem ele gostaria que fosse.

"The Flash": nos cinemas a partir de 15 de junho.


Crítica: Francisco Quintas

Com uma longa e polémica história à sua volta, “The Flash”, a nova entrada no Universo Estendido da DC, uma saga manchada por vários insucessos comerciais e artísticos, era um filme difícil de promover.

A primeira notícia acerca do desenvolvimento do projeto surgiu em 2014, quando o ator norte-americano não binário Ezra Miller foi escolhido para o icónico papel de Barry Allen, que se torna o super-herói mais veloz do mundo após ser atingido por um relâmpago. As indecisões pesaram sobre realizadores, guionistas e conflitos de agenda, adiando constantemente as datas de lançamento.

Entretanto, após rodagens em plena pandemia, o destino do filme foi novamente ameaçado: entre outros alegados incidentes não relacionados, Ezra Miller terá vandalizado e roubado um casal numa residência no Hawai.

O nervosismo dos empresários e a gritante indignação social que se seguiram, exigindo a substituição de Ezra Miller, coincidiram com a recente tomada de posse dos estúdios da DC: finalizada a relação com a Marvel, o realizador James Gunn assumiu o comando criativo do Universo Cinematográfico rival, que, apesar de adaptar o Batman, a Mulher Maravilha e o Super-Homem ao grande ecrã, esteve sempre um passo atrás.

O “reset” do autor de “Guardiões da Galáxia” (2014) e “O Esquadrão Suicida” (2021) propôs abraçar a tendência de séries televisivas de super-heróis e a coexistência de universos alternativos no cinema. E antes da sua entrada, “Batgirl”, baseado na personagem homónima, já fora cancelado e engavetado em plena pós-produção.

Sobre “The Flash”, realizado pelo argentino Andy Muschietti, responsável pelos filmes de terror “It” (2017 e 2019), mantinham-se todo o género de dúvidas.

Sabia-se que a premissa assentaria sobre viagens ao passado e distintas linhas temporais, jogada dominante no cinema “blockbuster” contemporâneo. Mas estaria de acordo com o ambicioso trilho de Gunn? Seria também adiado? Cancelado? Distribuído em streaming para decrescer o prejuízo? O ator substituído?

Numa estratégia de marketing, diga-se, que de ingénua nada teve, James Gunn, entendido das bandas desenhadas, publicitou-o como “um dos melhores filmes de super-heróis já feitos”, elogiando fortemente o seu protagonista. E com justiça.

“The Flash” tinha, portanto, três vilões a derrotar: o desinteresse provocado pela demora a nascer, a antipatia de algum público por Ezra Mille e a elevada expectativa cultivada por James Gunn nos últimos meses.

É certo que trunfos como, entre muitos outros, o carismático regresso de Michael Keaton, nas vestes negras e borrachudas do Batman do final dos anos 80, convencerá muitos fãs a comprar bilhete, não permitisse o multiverso infinitas possibilidades para contar e cruzar histórias. Não obstante, "The Flash" é um dos melhores títulos do Universo Estendido da DC.

O que surge no grande ecrã é um conto moral envolvente, divertido, universal, com emoção esmiuçada em larga escala, no primeiro plano de naves, efeitos sonoros e escapismo. Mesmo que uma rápida vistoria revele consideráveis falhas no guião: algumas cenas são repetitivas, denunciado um clara descrença na capacidade do público em reter o conceito do multiverso. Complexo ou mal esclarecido, ironicamente isto origina explicações precipitadas e confusão.

Como se pode esperar, “The Flash” depende seriamente dos mais excitantes efeitos visuais para funcionar e só teria a ganhar se, nomeadamente no terceiro ato, não cometesse alguns excessos. Ou, em alternativa, tivesse dedicado mais tempo à sua qualidade, visto que nem todos se apresentam convincentes em tamanho alvoroço.

Além disso, não desfazendo o grande impacto emocional dalguns momentos, o filme peca em tentar manipular o espectador através de diálogos ou música. Teriam, similarmente, a ganhar as atrizes Kiersey Clemons e Sacha Calle se as suas personagens assumissem uma presença mais interventiva e fundamentada.

Já Ezra Miller merece ser lembrado com uma das melhores escolhas de 'casting' no género de super-heróis: vivendo a parceria e as discórdias de versões diferentes da mesma pessoa e os consequentes dilemas, revela-se brilhante e com um genuíno entusiasmo pelo seu trabalho.

Se a reiterada “colisão entre mundos” for suficiente para combustar o novo universo cinematográfico DC, com parte do elenco renovada e personagens diversificadas em destaque, pode ser que o género alcance uma nova brisa. E se as histórias em papel receberem tanto cuidado quanto as bombásticas imagens computadorizadas, venham todas e mais algumas...