A HISTÓRIA: Sozinha numas férias à beira-mar, Leda (Olivia Colman) fica obcecada com uma jovem mãe e a sua filha ao observá-las na praia. Enervada com a relação cúmplice entre as duas (e a sua família numerosa, barulhenta e ameaçadora), Leda é dominada pelas suas próprias memórias do terror, confusão e intensidade da maternidade precoce. Um ato impulsivo atira Leda para um mundo estranho e sinistro da sua própria mente onde é obrigada a enfrentar as escolhas inconvencionais que fez enquanto jovem mãe e as suas consequências.

"A Filha Perdida": nos cinemas a partir de 3 de fevereiro.


Crítica: Daniel Antero

Leda (Olivia Colman) é uma professora de literatura comparativa que se refugia numa ilha grega para desfrutar de umas férias descontraídas. Mas quando se encontra com a jovem mãe Nina (Dakota Johnson) e observa a relação com a sua filha Elena, um reavivar de memórias tumultuosas desencadeia-se.

Com recursos a 'flashbacks', acompanhamos a jovem Leda (Jessie Buckley) na sua luta diária entre as exigências das suas filhas, o seu marido (Jack Farthing) e a sua carreira. Quando estas memórias se tornam demasiado pesadas para serem reprimidas, Leda tem um gesto repentino que transforma este drama melancólico num 'thriller' psicológico: ela rouba a boneca de Elena, instalando um ambiente de paranoia no seio da família da criança.

Partindo de um livro cuja escrita é do ponto de vista interno de Leda, o argumento da atriz Maggie Gyllenhaal e do editor brasileiro Affonso Gonçalves aborda a psique desta mulher jogando com ousadia o subtexto e a subjetividade de Elena Ferrante.

Com Olivia Colman no centro deste exame de consciência, a montagem procura criar algo matizado: interligando a tensão corporal da atriz com silêncios e conectando várias cenas através de uma só conversa, o filme abre-se a pensamentos mais profundos que serão revelados somente no futuro, com uma visita ao passado.

Esta carga associada ao simbolismo de um inseto na almofada, uma pinha que atinge Leda nas costas, uma agulha que segura um chapéu, e claro, a boneca perdida, roubada, assombra o impacto das ações de Leda e o porquê do seu ato mais perturbador. Porque quando os adultos dão bonecas às filhas, encaminham-nas para um comportamento e mentalidade de que um dia serão mães responsáveis…

Infelizmente, esta última ideia é mastigada numa procura incessante de densificar a angústia mental e paranoia, tornando este filme mais repetitivo do que atordoante.

“A Filha Perdida” não é um retrato de arrependimento. Existe pesar, mas também há indícios de desejos secretos, com os quais, de modo perturbador, Maggie Gyllenhaal, na sua estreia atrás das câmaras, cria o retrato sensível de uma mulher que abandonou o sufoco que a sociedade impõe sobre o instinto maternal, para viver de forma independente. E mesmo dececionando com o seu fraco desenrolar, com o uso do passado e as suas projeções, a realizadora consegue fazer com que uma sensação de nó no estômago vá crescendo. Algo que, como Leda, teremos de perfurar para ajuizar e conseguir paz de espírito.