Quando pensamos em mandíbulas aquáticas enviesadas no universo cinematográfico, somos automaticamente remetidos para tubarões e esqualos à moda de Steven Spielberg.

Sim, falo de “Jaws”, ou “Tubarão” (1975), como foi assim intitulado em “praias” portuguesas, o filme que arrasou quarteirões em plena época estival, inaugurando o chamado "blockbuster" de verão, uma nova oportunidade de agenda para os grandes estúdios lançarem as suas apostas milionárias.

Obviamente que há que agradecer a Spielberg e o seu método “know how” por ter construído uma obra astuta e reflexiva à histeria coletiva integrado num modelo de filme de monstro, elementos que funcionaram e que estabeleceram parâmetros invejados nesta atualidade.

Mas isso são outras histórias e desde essa data, os peixes cartilagíneos tornaram-se estrelas e, hoje, protagonistas de um subgénero à parte.

Passando para outras letais criaturas das profundezas, em 2010, o parisiense Alexandre Aja, um dos precursores da nova vaga francesa de terror, tinha contaminado litorais com cardumes de piranhas pré-históricas no delirante “Piranhas”. Nove anos depois, regressa às águas para nos trazer um pesadelo partilhado pelos locais do estado da Flórida: aligatores.

Ao contrário dos seus “colegas” tubarões, crocodilos e seus parentescos nunca se assumiram como verdadeiramente estrelas de cinema. Aliás, sempre ficaram como obstáculos secundários, sendo por poucas vezes o monstro-cartaz. A incursão de Tobe Hooper (realizador de “Massacre do Texas”) em “Comidos Vivos!” (1975) ou até o último grande crocodiliano “O Lago” (1999) estão entre os escassos "exemplares" que sobressaem desta espécie em vias de extinção. Porém, é incerto que “Rastejantes” entre nessa galeria com afinco.

Se seguirmos o percurso de Alexandre Aja, compreendemos que o grande erro de “Rastejantes” está no seu não-assumido escapismo, ao contrário do anterior “Piranhas”.

O que acontece é que este modo de sobrevivência é exagerado, desajeitado e acima de tudo, nada credível, quer quanto ao comportamento das personagens em situações limites, quer das criaturas sobrenaturalmente sádicas, compostas por um grotesco CGI (ao contrário dos efeitos práticos utilizados em “O Lago”, estes crocodilos estão longe de nos convencer). E à volta desses “brindes” encontra-se um embrulho sobre-dramático e um jogo de gato-e-rato a seguir as pistas deixadas pelo estilo “slasher” (para além das enésimas a “Tubarão”, a começar pelos "travellings" submersos e os acordes musicais de Max Aruj e Steffen Thum).

De forma mais diretas e simples, “Rastejantes” tenta e deseja, mais que tudo, ser levado a sério, contrariando a sua natureza disparatada que só salvaria dentro dos parâmetros da série B. O novo filme de Alexandre Aja é obviamente um sucessivo rol de más decisões e é perante essa ferida que o argumento, infantilizado e sem rigor de espaço e vontade, instala-se como um golpe misericordioso. Até porque deve-se acabar com o sofrimento... veja-se o caso do ator Barry Pepper, que depois disto terá tempo suficiente para repensar a sua carreira.

"Rastejantes": nos cinemas a 11 de julho.

Crítica: Hugo Gomes

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