A HISTÓRIA: Após 12 anos na prisão, Eddie Palmer volta para casa para reconstruir sua vida. Ele cria uma ligação inesperada com Sam, um rapaz marginalizado e com uma família problemática. Mas o passado de Eddie ameaça arruinar a sua nova vida.

"Palmer": disponível na Apple TV+ desde 29 de janeiro.


Crítica: Daniel Antero

O novo filme do realizador Fisher Stevens (habitualmente a operar mais no campo documental), traz-nos a história de Eddie Palmer (Justin Timberlake), uma antiga estrela do futebol do liceu que regressa à sua cidade natal rural de Louisiana, após uma pena de 12 anos de prisão, e se torna a única barreira entre os serviços de proteção infantil e Sam (Ryder Allen), uma criança de sete anos.

Drama convencional, "Palmer" não é sobre como o ex-presidiário lida com o estigma para se reintroduzir na sociedade. Embora sejamos guiados por cenas onde este se acomoda às novas vivências, reconectando-se com os amigos de tempo de liceu e procurando emprego, o guião de Cheryl Guerriero é, na verdade, sobre como os residentes desta cidade conservadora, que se unem para aplaudir as glórias do futebol e fazem da igreja segunda casa, lidam com a identidade de Sam.

É que Sam se veste de menina, maquilha bonecas, organiza festas de chá imaginárias e sonha em tornar-se uma princesa como as do programa de televisão “Sky Princesses”.

Infelizmente, Stevens e Guerriero não procuram consequências estruturais e sistémicas e abordam Sam com superficialidade. Como que querendo introduzir o tópico da fluidez de género ao de leve, dada a dificuldade ainda presente de como lidar e percecionar o tema, optam por enveredar pela via emocional para apontar a miopia realista e a mentalidade tacanha e machista da comunidade.

Assentando a narrativa em Palmer e tornando Sam acessório, perde-se a oportunidade de debate. Condescendentes e benevolentes em relação à limitação da compreensão da comunidade sobre a criança, realizador e argumentista acabam por nos mostrar a mudança de moralidade dos residentes através de sequências onde Palmer protege Sam de bullying, tanto pequenos como graúdos, quase sempre de modo violento. O que ricocheteia com ainda mais miopia.

Apesar de nunca colocar a vitimização de Sam como motor do filme, o que é de realçar, ainda por cima quando a própria personagem é muito segura de si, optimista e com um sentido de justiça apurado, Fisher Stevens refugia-se na adorabilidade da criança para simplificar conceitos e criar uma aura de conforto.

Com um guião amorfo, projetado para emocionar de forma simplista e directa, "Palmer" acaba por se focar na personagem errada. Há por aqui muito coração, mas também um equívoco, porque o filme só bate a sério quando aparece Sam.