A HISTÓRIA: No rescaldo de uma catástrofe global, um cientista solitário que se encontra no Ártico tenta contactar uma tripulação espacial com um aviso para não regressarem à Terra.

"O Céu da Meia-Noite": disponível na Netflix a partir de 23 de dezembro.


Crítica: Hugo Gomes

Não vamos mentir: houve tempos em que George Clooney era um nome entusiasmante do outro lado da câmara, como realizador. Até foi ele que, em 2002, sob um guião de Charlie Kaufman, catapultou Sam Rockwell para se tornar um dos mais vigorantes atores de Hollywood com "Confissões de uma Mente Perigosa”, muito antes do Óscar por "Três Cartazes à Beira da Estrada".

Seguiu-se um ensaio politizado com o melhor do David Strathairn chamado “Boa Noite, e Boa Sorte” (2005) e um acutilante olhar cínico para os bastidores das campanhas eleitorais, e o confronto entre ideologia e conformismo de sobrevivência, no ainda muito esquecido "Nos Idos de Março" (2011).

Esta trindade de obras curiosas dentro do panorama do cinema americano foi acompanhada por alguns sumiços autorais e sedentarismo académico em filmes que não ficaram para a história: "Jogo Sujo" (2008), "Os Caçadores de Tesouros" (2014) e "Suburbicon" (2017).

O filme mais recente, para a Netflix, poderá posicionar-se entre as duas classes: "O Céu da Meia-Noite” é a adaptação de um livro de Lily Brooks-Dalton e, por coincidência , responde aos tempos incertos a que assistimos, embarcando na história do isolamento de um homem posto de fora de um êxodo num mundo pós-apocalíptico, testemunhando imponente e angustiadamente ao fim da Humanidade como a conhecemos.

Por diversas vezes em entrevistas, Clooney, realizador e protagonista, referiu as influências para esta sua sétima longa-metragem – “Gravidade” (2013), em que entrou, e “The Revenant: O Renascido” (2015), com o qual partilha também o argumentista Mark L. Smith. Ou seja, a vastidão do espaço e o deserto de gelo, ingredientes que em "O Céu da Meia-noite" colidem numa narrativa “salta-pocinhas” e uma "calorosa" reviravolta.

O problema aqui é que a jornada pretensiosa e além-fronteiras nos traz apenas um vazio, disfarçado de virtuosismo tecnológico. As emoções, essas, são tão frias e artificiais como os hologramas de memórias que os exploradores espaciais recorrem para mitigar as saudades de “casa” e dos entes queridos.

Talvez a culpa seja maioritariamente do argumento e da opção pela lamechice pura, em que o “armagedão” deixa de interessar e tendem-se a “preservar” os vínculos afetivos, tendo a família como ponto sagrado. Seja como for, Hollywood poderia mudar um pouco de disco e desejam-se sinceramente a George Clooney melhores projetos para voltarmos a estar minimamente interessados pelas seus projetos artísticos e criativos como realizador.