A HISTÓRIA: Por ocasião da morte do seu amado editor Arthur Howitzer Jr., nascido no Kansas, a equipa das "Crónicas de França", uma revista americana de ampla circulação, com sede na cidade francesa de Ennui-sur-Blasé, reúne-se para escrever o seu obituário. Memórias de Howitzer fluem para a criação de quatro histórias: um diário de viagem das secções mais sórdidas da própria cidade do O Repórter Ciclista; “A Obra-Prima Concreta”, sobre um pintor criminalmente louco, o seu guarda e a sua musa, e seus vorazes negociantes; “Revisões a um Manifesto”, uma crónica do amor e da morte nas barricadas no auge da revolta estudantil; e “A Sala de Jantar Privada do Comissário de Polícia”, um conto de suspense sobre drogas, rapto e jantares chiques.

"Crónicas de França do Liberty, Kansas Evening Sun": nos cinemas desde 11 de novembro.


Crítica: Daniel Antero

Algo que associamos ao trabalho virtuoso de Wes Anderson são as composições milimétricas, os anacronismos, as inúmeras referências à arte, à cultura e a si mesmo. A sua décima longa-metragem mantém este estilo pitoresco e com um novelo de detalhes compõe uma nostalgia militante dentro de uma casa de bonecas.

"Crónicas de França do Liberty, Kansas Evening Sun" é um coleção de contos episódicos cheio de memórias agridoce de um tempo e de um lugar que já não existe. Invocando o cinema lúdico de Louis de Funès, Jacques Tati e o melancólico de Marcel Carné pelas ruas da cidade fictícia de Ennui-sur-Blasé (algo que se traduz como “tédio sobre a apatia”), o realizador revela que algo puro desapareceu: o jornalismo literário e os seus autores.

Preparem-se para se maravilhar com caricaturas, bigodes cuidados, cenários engenhosos e o absurdismo que Anderson impregna no dia-a-dia. Tudo num mundo repleto de personagens que se veem sair lentamente do presente, enquanto mantêm uma atitude militante para com o passado vigoroso que os apaixonou.

Mas numa “casa de bonecas” onde vivem Benicio del Toro, Bill Murray, Christoph Waltz, Edward Norton, Frances McDormand, Léa Seydoux, Mathieu Amalric, Owen Wilson, Saoirse Ronan, Tilda Swinton, Timothée Chalamet e muitos mais, esperava-se que a expressividade formal de Anderson enaltece-se as suas personagens excêntricas, em vez de as abafar, ofuscando a história.

Apesar de o realizador americano viajar por temas tabu e 'new waves', explorando a expressão artística através da arte moderna, demência, sexualidade e o movimento estudantil, o apego alegre, emocional e humano que caracterizavam os seus melhores filmes, aqui perde-se, deixando-nos a olhar para o virtuosismo imagético onde algumas tontices vão acontecendo em ritmo cada vez mais acelerado.

"Crónicas de França do Liberty, Kansas Evening Sun" é vintage, uma antologia que destila as idiossincrasias e tiques de um realizador que se declara apaixonado pela arte de contar histórias, mas que se perdeu na narrativa da sua própria obra.