A HISTÓRIA: A história dos supervisores de uma escola de Long Island responsáveis pelo maior escândalo de desfalque no ensino público na história da América.

"Bad Education" está disponível na HBO Portugal.


Crítica: Hugo Gomes

Estávamos em 1999, quando estreava entre nós “Eleições”, obra de Alexander Payne (que viria mais tarde ser totalmente reconhecido com “As Confissões de Schmidt” e “Nebraska”), que dispunha através de uma corrente de autodestruição pessoal as grandes diferenças entre moralidade e ética.

O jogo fazia-se pela ambiguidade: um Matthew Broderick (o eternizado Ferris Bueller tornou-se professor dedicado) encontrava na ambiciosa e jovem Reese Witherspoon um futuro inimigo, não apenas da sua causa ética, mas para a sociedade.

Porquê invocar este filme por vezes esquecido? Simples: "Bad Education", inspirado num caso real que obteve mediatismo através de um artigo da New Yorker, usa como bandeja essa mesma dicotomia entre moralidade e ética. Repetem-se a ambiguidade, os ares de escalada descendente e o dilema para o espectador entre os devidos valores e a consciência.

Tudo está invisivelmente entranhado em Hugh Jackman na pele de Frank Tassone, supervisor de uma rede de escolas de topo que invoca constantemente os poderes da educação e os frutos colhidos em gerações futuras... para encobrir uma fraude quase patológica de desvio de fundos.

Sem nunca sair dos eixos do convencional nem emaranhar-se em "chico-espertismos" de um Adam McKay (havia um receio para essa abordagem de "A Queda de Wall Street"), o segundo trabalho de Cory Finley (após o ainda inédito em Portugal "Thoroughbreds", de 2017) dá-nos um filme espirituoso e, de certa forma, atormentado pelas suas próprias causas.

Como cúmplice do "crime" surge um calculista Hugh Jackman (o sarcasmo de Allison Janney tem a sua quote no "show"), entre a empatia e as dúvidas constantes por causa dos atos questionáveis.

Apesar do filme não poder concorrer aos Óscares por ter sido lançado em streaming sem nunca ter prevista a estreia nos cinemas, o desempenho é mais que recomendável e esperemos que se esgotem as dúvidas que o ator australiano é um dos grandes "lead men" das últimas duas décadas: enquanto descortina uma sede existencial e afetiva para lá do signo do truque matreiro, ele afasta-se da mera esquematização biográfica e aposta numa personagem de camadas, literalmente, que decifrarão mais do filme do que do próprio de Frank Tassone.

Os maneirismos, a preocupação estetizada e a máscara da discrição que é usada como arma para a não-interação social, são mais do que pormenores da personagem: tratam-se de analogias sobre uma sociedade assente em aparências, que ficam acima das condutas éticas.

Pelo meio, fica a imagem dos professores, os “sentinelas” dos valores morais, proclamados para formar a sua “descendência”. São eles os inquisidores da atualidade, os corretores da “verdade” e os formadores dos senhores do amanhã.

De alguma maneira, "Bad Education" funciona como uma imagem da América "pré-Trump", a dos políticos formatados em ditames e sermões, que projetam uma imagem de "provedor do bem" que nos desvia o olhar dos esquemas ocultos e da falência moral. Tudo mudou: hoje é mais... como diríamos... "escancarado".